Em 2000, O Tigre e o Dragão despontou como um verdadeiro fenômeno cultural: o público ocidental hollywoodiano tinha ali seu primeiro contato mainstream com um filme de wuxia, popular gênero de aventuras de artes marciais na China. A direção sensível de Ang Lee e o frescor de novidade garantiram ao longa não só uma boa recepção crítica e quatro estatuetas do Oscar, mas também sucesso financeiro, se mantendo até hoje no posto do mais lucrativo filme estrangeiro da história das bilheterias norte-americanas.

Dezesseis anos se passaram para que uma sequência ganhasse vida, agora com estreia direto no catálogo da Netflix, e em alguns poucos cinemas nos EUA e na China. Mas, se você tinha alguma expectativa, melhor deixá-las de lado a partir de agora: O Tigre e o Dragão: A Espada do Destino compartilha pouca coisa em comum com o filme original, com exceção do título.

Da escalação original, Michelle Yeoh é a única a retornar, no papel da sábia guerreira Yu Shu Lien. Depois de perder seu amado Li Mu Bai no primeiro filme, Shu Lien optou por viver uma vida solitária, como um “fantasma esquecido”, mas se vê de volta ao mundo das lutas suspensas no ar quando são reveladas as intenções do perigoso Hades Dai (Jason Scott Lee) de roubar a espada Destino Verde, que pertencia antes a Mu Bai.

Sim, o resultado é exatamente o que essa sinopse parece anunciar: um longa de ação genérico, que em nada lembra o lirismo do primeiro O Tigre e o Dragão. São tantos os problemas que, para que esse texto não pareça tão irritante quanto o filme, resolvemos elencar os piores destaques abaixo, no nosso guia ilustrado do que há de errado com A Espada do Destino:

1. Isso não é a China

A começar pelo fato de ser totalmente falado em inglês, O Tigre e o Dragão: A Espada do Destino parece uma história que poderia facilmente se passar em qualquer outro lugar. A estética oriental do primeiro filme e a filosofia por trás do kung fu passam bem longe aqui. As locações na Nova Zelândia e o design de produção equivocado de Grant Major, que trabalhou na trilogia O Senhor dos Anéis, nos faz pensar que estamos sempre no Condado ou que um orc vai aparecer a qualquer momento. Trívia: olhe para as torres acima e responda: algumas escolhas arquitetônicas à parte, qual é a diferença entre a torre de Saruman e o castelo de Hades Dai?

Além disso, o que dizer do Lobo Silencioso, em situações saídas diretamente de um filme de faroeste, com direito a lenço cobrindo a cara e chapéu misterioso? E você pensando que era um filme de wuxia


2. Nada é natural

Ter Yuen Woo-ping, coreógrafo do primeiro filme e de outros longas como Kill Bill e Matrix, assumindo aqui a cadeira de direção deveria ser um trunfo a mais do filme. Infelizmente, não é. A direção de Woo-ping é precária, e se as coreografias de luta deveriam ser o ponto alto do filme, elas soam apenas óbvias e mal filmadas. Toda a metáfora por trás da flutuação dos personagens no longa original aqui não existe mais, já que todo mundo faz isso a todo tempo. Aliás, nada parece natural em A Espada do Destino: cada frame parece que recebeu um filtro do Instagram diferente, deixando a grama o mais verde possível, e o CGI barato domina os planos que deveriam explorar o ambiente da China medieval. Até a espada do título agora tem efeitos verdes reluzente ao redor da lâmina, em vez da aparência de gasta no original.

3. Ninguém se importa com os personagens

O Tigre e o Dragão era um filme que realmente se importava com seus personagens e o desenvolvimento deles, e isso era parte essencial da alma do longa, mais até do que sua trama. A Espada do Destino prefere introduzir rapidamente uma série de coadjuvantes sem personalidade e sem importância, tanto que, no fim das contas, não faz diferença nenhuma quando morrem.

4. O vilão

Olhe bem para a cara do Jason Scott Lee como Hades Dai neste frame. Compare com as outras expressões durante todo o decorrer do filme. O resultado será idêntico em todas.

5. Fraca história

Como se já não bastasse o roteiro fraco de John Fusco (Marco Polo), que renega valores e princípios estabelecidos na história anterior, a montagem é problemática, e o filme parece apenas uma sucessão de desculpas para mais cenas de luta. Tudo é apressado e mal resolvido, ainda que a sensação seja de que o filme se arraste e pareça ter muito mais tempo do que o normal.

Veredicto: nem mesmo Michelle Yeoh, para quem parece que 16 anos nem se passaram, e que mantém uma atuação digna e um porte elegante, é capaz de salvar o desastre que é O Tigre e o Dragão: A Espada do Destino. Longe de capturar o espírito do original e longe de pelo menos se estabelecer um filme eficiente em seus próprios méritos, A Espada do Destino é apenas uma pálida e desnecessária sequência, daquelas que, nos anos 90, iria ser lançada direta em VHS. É uma aventura genérica, que poderia se passar em qualquer lugar com quaisquer personagens (olá, Eragon, Dungeons and Dragons e similares). Em resumo, é tudo, menos um épico.