O conceito da franquia Os Mercenários é potencialmente muito interessante. A ideia de reunir os velhos astros dos filmes de ação dos anos 1980 e 1990 num só mega-espetáculo imediatamente desperta aquela área meio irracional do cérebro dos espectadores que hoje estão na casa dos 30 ou 40. Houve uma época em que esses caras eram verdadeiros semideuses das telas, capazes de feitos impossíveis ainda hoje lembrados com nostalgia por esse público. Basta lembrar de um deles, o astro e diretor Sylvester Stallone, idealizador da franquia. Ele praticamente redimiu os Estados Unidos na revanche pelo Vietnã com seu personagem Rambo. Quando jovens, não havia nada que eles não pudessem fazer.

Mas, como já dizia uma velha canção dos Rolling Stones, “What a drag it is getting old…” (Como é chato ficar velho). Agora, os dinossauros do cinema de ação parecem olhar a extinção nos olhos em Os Mercenários 3, o mais fraco exemplar da franquia que até agora rendeu um filme razoável (o primeiro) e um legal (o segundo). Mais longo que os anteriores, mais pesado, menos divertido e até um pouco melancólico em alguns momentos, o filme expõe a fragilidade por trás da franquia: os três filmes se apoiam exclusivamente no conceito. A produção reúne o Rambo, o Exterminador do Futuro, o Frank Martin, o Blade, o Martin Riggs e o Indiana Jones num filme só, mas não dá nada de interessante para eles fazerem. Não há personagens legais e carismáticos, não há uma trama empolgante, nem nada. Apenas a mesma história contada de novo, acompanhada do apelo à nostalgia.

Assistir ao terceiro filme da franquia é como ouvir pela terceira vez a mesma piada e a graça já está desaparecendo.

E realmente é a mesma história contada de novo. O primeiro e o ultimo atos de Os Mercenários 3 são, essencialmente, idênticos aos do filme anterior. No começo, vemos a equipe de Barney Ross (Stallone) resgatando um prisioneiro (de novo). E logo começa o exercício de piscadelas para a plateia: o prisioneiro é um sujeito apelidado de Doutor Morte e é interpretado por Wesley Snipes. Ele até diz, com jeito meio cínico, que estava preso por “sonegação de impostos”, como aconteceu com Snipes na vida real. Todo mundo ali está interpretando a si mesmo e reverenciando seus velhos personagens e sucessos, e também eventos das suas vidas. O filme começa com o resgate de Snipes porque Stallone não é de deixar um amigo em dificuldades, seja à frente ou atrás das câmeras.

Mas aí se percebem dois problemas: o personagem do Doutor não é muito interessante, apesar da esquisitice que Snipes injeta no personagem, e o roteiro do filme não oferece nada a não ser mais piscadelas. Depois, numa nova missão, os Mercenários se dão mal – Hale Ceasar (Terry Crews) é ferido, aparentemente porque ter dois caras negros na equipe seria demais – e Ross descobre que um antigo inimigo julgado morto está vivo. Ele é Conrad Stonebanks (Mel Gibson), um dos membros fundadores dos Mercenários que virou traficante internacional de armas.

É mais fácil aceitar Stonebanks como vilão porque Gibson o interpreta. Afinal, foi basicamente isso que o ator se tornou nos últimos anos, graças às suas diatribes malucas contra os judeus e contra sua ex-namorada. De todos os astros dos filmes de ação dos anos 1980 e 1990, foi Gibson quem mudou de lado e passou a ser visto como um monstro – e isso é mais uma piscada de olho para a plateia.

Curiosamente, dentre os velhinhos do filme é Gibson quem mais se diverte, abraçando o papel de vilão com gosto. Toda vez que ele está em cena, há uma energia maluca na tela, igual como se via nos melhores momentos do “Mad Mel”. Além disso, ele é responsável, ao lado de Stallone, pela melhor cena do filme, a conversa entre Stonebanks e Ross no furgão. Nesta e em algumas outras cenas, pode-se ver traços do antigo carisma que transformou Gibson num dos maiores astros de cinema do mundo. Os Mercenários 3 pode ser o pior da série, mas tem o melhor vilão dos três filmes.

Essa cena do furgão ocorre quando, no segundo ato, os roteiristas resolvem tomar emprestado um pouco do miolo de Missão Impossível 3 (2006) e fazem com que Ross, agora com uma nova e mais jovem equipe, invadam uma negociata do vilão e o sequestrem. A respeito dos jovens Mercenários, eles não chegam a se destacar nem a comprometer a experiência. Apenas Ronda Rousey, a lutadora de MMA transformada em atriz, desperta um pouco mais de atenção, mas não porque o roteiro torna sua personagem interessante. É mais porque ela é a única mulher num filme cheio de homens enrugados e outros ainda sem rugas.

No fim das contas, ninguém paga ingresso para Os Mercenários para ver gente jovem. Porém, neste terceiro filme em especial, o cansaço da fórmula se estende aos atores. Stallone parece mais triste em cena, como se já sentisse que seu tempo como herói de ação esteja chegando ao fim. Schwarzenegger parece ter finalmente se transformado num robô – sua presença em cena se assemelha a um bloco de granito, pesadão e estranho sempre que aparece. Antonio Banderas começa divertido com seu personagem Galgo, mas depois se torna aborrecido. E é deprimente ver Harrison Ford como contato da CIA – engessado em cena, o ator se mostra apenas uma lembrança triste do grande Indiana Jones. Aliás, Ford entrou no filme quando Bruce Willis, que fez o homem da CIA nos anteriores, pediu um cachê muito alto e foi dispensado sem cerimonia por Stallone. Porém, aparentemente quase nada foi mudado quando o ator foi trocado – pode-se facilmente ver Willis fazendo o papel, outro exemplo de preguiça do roteiro.

O diretor Patrick Hughes dirige tudo sem muita imaginação e de forma até um pouco mais séria que nos anteriores, porém essa seriedade só deixa o filme mais sem graça. Isso, aliado ao roteiro reciclado, faz com que Os Mercenários 3 se arraste no meio e conclua com outro tiroteio apocalíptico contra um pequeno exército (como no primeiro) e com direito a um duelo final entre Stallone e o vilão (como no segundo). A luta entre Stallone e Jean-Claude Van Damme no segundo filme, porém, foi mais emocionante. Há um excesso de efeitos em computação gráfica, como na perseguição dos helicópteros, e a violência desta vez foi atenuada. Uma das atrações dos dois primeiros Mercenários era justamente a violência à moda antiga, opondo-se aos filmes de ação mais leves dos últimos anos. A decisão de abrandar nesse quesito para tentar um apelo junto ao público mais jovem só deixa este terceiro filme mais “mercenário”, com o perdão do trocadilho.

É uma pena que a produção, e a franquia como um todo, tenha ambições tão pequenas. Imaginem o que um bom roteirista e um cineasta de talento e realmente apaixonado pelos velhos filmes de ação poderiam fazer com esse conceito…  Do jeito que são, os filmes da série Os Mercenários sempre foram uma piada compartilhada entre o elenco e o publico. Essa piada chegou a ser engraçada para os dois lados em alguns momentos, mas depois de ser contada três vezes a graça começa a desaparecer, e não há nostalgia que consiga fazê-la ressurgir.

NOTA: 4,5