Chama minha atenção como Kelly Fremon transpõe para o cinema momentos diferentes de amadurecimento feminino, seja no roteiro — como na jornada após a faculdade de “Recém-formada” — seja na direção como em “Quase 18”. Desta vez, no entanto, a diretora expande a discussão sobre amadurecimento para um grupo feminino maior, abordando crescimento geracional, religião e a descoberta do seu lugar no mundo. 

“Crescendo Juntas” acompanha a jornada de Margaret (Abby Ryder Fortson), uma menina de 11 anos que precisa lidar com a mudança de sua família de Nova York para o subúrbio. O deslocamento geográfico é apenas um indicativo de todas as transformações internas que a protagonista passa, as quais Fremon dedica um olhar sensível, pueril e cotidiano. 

Amadurecimento em família

Como o próprio título do filme indica, a narrativa se alicerça em mostrar como o amadurecimento feminino acontece em fases diferentes da vida, de acordo com os desafios e as transformações impostas pela vivência. Temos três mulheres de gerações divergentes que enfrentam o mesmo dilema: seguir caminhos novos e se reestruturar. Cada uma faz suas escolhas conforme a cosmovisão que possuem, o interessante é observar como estão mergulhadas dentro de suas próprias questões e, ao mesmo tempo, as duas mais velhas se policiam pelo bem de Margaret, para quem todas as decisões fluem. 

Nesse sentido, Bárbara (Rachel McAdams) parece enfrentar entraves maiores, uma vez que está aprendendo a ser mãe, esposa, nora e filha — tudo ao mesmo tempo. Enquanto a protagonista vive questões internas próprias da idade, a mãe parece estagnada, como se ainda não entendesse seu lugar no mundo, parte disso tem que ver com o grau de seu relacionamento materno e ainda com a mudança geográfica. Assim, a trama se pauta em um amadurecimento de mãe e filha, no aprendizado que pode ser desenvolvido em qualquer momento da vida e por meio de aspectos simples. 

Externo vs Interno

É preciso salientar que existe um contraste entre o ambiente externo e as questões internas da protagonista. Sua família está saindo de uma cidade agitada para um lugar mais calmo, em que seja possível conviver e estabelecer conexões com a vizinhança, como se a personagem central estivesse se separando do mundo infantil para adentrar na jornada adulta. 

Neste ambiente exterior, Margaret é incluída na sociedade local desde sua chegada, por meio da aproximação de Nancy (Elle Graham) que praticamente invade sua casa e a inclui automaticamente em seu grupinho. Embora a vizinha exerça uma grande influência sobre as meninas que a rodeiam, a filha de McAdams é bem resolvida e faz suas próprias escolhas, mesmo que estas possam ir de encontro aquilo que o grupo valida. 

O interessante nesta construção é perceber como a chegada a este novo ambiente e a amizade com Nancy e seu grupo ofertam a protagonista a possibilidade de viver situações pela primeira vez. Assim, o percurso abre portas para que se explore outras temáticas vinculadas tanto a questão de crescimento quanto de feminilidade, como, por exemplo, a festa sem supervisão adulta, a compra de um sutiã e a chegada da primeira menstruação. 

Oi, Deus!

Há, no entanto, também questões internas que perpassam a personagem. Por dentro, ela alimenta questionamentos que não consegue compartilhar com mais ninguém, a não ser com a figura divina com quem passa a perguntar “Você está aí, Deus?”. Gosto de como a diretora, também roteirista, decide abordar o relacionamento da menina com a divindade, tratando como algo fluido, natural, sem as amarras e ritos que alguns credos religiosos procuram impor. 

Considerando que a oração é abrir o coração como a um amigo, é justamente isso que Margaret faz. Ela dirige suas angústias a Deus, suas revoltas e busca dEle respostas para os seus dilemas, ao mesmo tempo, em que procura aproximar-se fisicamente dEle em algum templo onde possa congregar-se. Tanto a busca quanto a liberdade que usufrui de escolher o credo ao qual pertencer, servem como alegoria para o que a vida adulta pode indicar a personagem: o momento de tomar decisões e seguir seu caminho. 

“Crescendo Juntas” encontra meios diferentes e singelos para discutir o processo de amadurecimento. Abby brilha em meios as dúvidas e questionamentos que Margaret suscita, enquanto isso, Fremon mostra mais uma vez como é possível construir um coming age a partir de pequenos acontecimentos da vida . E são esses os mais preciosos, quando bem vividos e dirigidos.