Enquanto a projeção de “Instinto Materno” se desenrolava na sessão de 21h25 de uma segunda-feira na Tijuca, a mente se esforçava para lembrar da trama de “Uma Família Feliz”, visto há menos de sete dias. Os detalhes das reviravoltas rocambolescas já ficaram para trás. Mas há algo em comum entre as duas obras: ambas transitam pelo espaço do thriller doméstico, o que lhes dá um certo ar de filme B dos anos 90 dificilmente encontrado nos multiplexes de hoje. 

O que significa, também, que estamos no campo das suspeitas e paranoias. Nos anos 1950, duas donas de casa compartilham a domesticidade idílica de um subúrbio americano. Ambas têm filhos pequenos; Jessica Chastain interpreta a mãe neurótica; já Anne Hathaway é uma genitora mais voltada ao laissez-faire, pelo menos, no que tange à criação da sua prole. 

Mas eis que uma grande tragédia abala a vida das duas vizinhas e o clima de desconfiança, permeado pela culpa e ressentimento, acaba se instalando. Como de praxe no gênero, as reviravoltas da trama garantirão que nada é o que parece. Mas, se for para retomar a comparação com “Uma Família Feliz”, algo aqui assegura uma experiência no geral mais suave (mesmo que igualmente esquecível). O quê? 

Simples: “Instinto Materno” não só joga no seguro; ele faz do seguro sua razão de ser. Se o grande pecado do longa protagonizado por Grazi Massafera era a total falta de personalidade, que conflitava com os impulsos histriônicos da sua trama rocambolesca, aqui é justamente a mediocridade que garante que o longa flua melhor. 

GRANDE VAZIO

O francês Benoît Delhomme, que já atuou como fotógrafo de longas visualmente espalhafatosos como “No Portal da Eternidade”, assume não só as câmeras como a cadeira de direção deste “Instinto Materno”. Seu feito não deixa de ser impressionante, portanto: ele conseguiu conceber um filme que, visualmente, é um grande nada, com uma paleta pálida e uma câmera na mão extremamente satisfeita em ser meramente funcional, obrigado. 

O que ajuda também é que a própria trama é mais contida. Como em “Uma Família Feliz”, o mote do filme é a crescente paranoia e a possível insanidade de uma dona-de-casa. Mas “Instinto Materno” é econômico em suas reviravoltas e sequer ousaria tentar as acrobacias e malabarismos narrativos que o thriller nacional tenta, sem sucesso, abarcar. Não que o plot twist, que, afinal, é parte do gênero, não marque presença, mas, aqui surge tão truncado e previsível que é incapaz de gerar qualquer tensão ou interesse. 

O que sobra são duas atrizes profissionais demonstrando uma vez mais que sabem arregalar bem os olhos e chorar em cena.