“Los Agitadores”, novo filme de Marco Berger (“O Caçador”), é uma desconfortável viagem às últimas consequências da masculinidade tóxica. O longa, que teve a première mundial na mostra Proxima do Festival Internacional de Cinema de Karlovy Vary deste ano, bebe da fonte dos thrillers para contar a história de um inusitado encontro onde nem tudo é o que parece. Plateias queer devem abraçar a produção, ainda que sua pegada misteriosa também caia como uma luva no Supercine. 
 
Nela, o espectador é convidado ao mundo de jovens argentinos dos arredores de Buenos Aires que estão passando a semana entre Natal e Ano Novo na casa de um deles. O grupo passa o dia a jogar videogame, beber, nadar e pregar peças uns nos outros – até que a chegada de um membro particular do time dá o pontapé em uma perigosa sequência de eventos. 
 
As brincadeiras dos marmanjos dão a entender que eles são, no fundo, meninos que não cresceram. Elas são filmadas de maneira cômica por Berger, mas o hermano coloca uma dose salutar de hesitação nas entrelinhas para sugerir que há algo de podre no reino da meninada. 
 
Esses jovens – largamente machistas, homofóbicos e descerebrados – tem uma fascinação pelos corpos uns dos outros. O roteiro, assinado pelo diretor, leva ao extremo as clássicas brincadeiras de “mão boba” para fazer perguntas contundentes sobre o processo de racionalização do homoerotismo na cabeça de pessoas que desconhecem o mero conceito – muito menos o aceitam. Aqui vale a velha retórica: pode pegar o pau do amigo, mas beijar na boca é coisa de gay. 
 
Homoerotismo é uma peça-chave no longa, mas “Los Agitadores” não é um filme sobre homossexuais. Não que eles não existam na trama, mas a sexualidade tóxica entre homens é a grande preocupação do longa, que começa a ganhar contornos de suspense conforme as interações vão ficando mais agressivas. 
 
Essa leitura é reforçada pela ambientação da história numa casa de campo afastada – clássica do gênero. Longe da sociedade e sem limites, o comportamento hiperssexual dos jovens vem à tona e o desejo de explorarem os próprios corpos aparece de maneira latente. Em seu pequeno microcosmo, eles conseguem lidar com isso. Só quando o mundo exterior vem bater à porta (como quando uma foto bastante quente feita entre eles vaza) é que eles se sentem em conflito. 
 
Em vários pontos dos 102 minutos de projeção, Berger usa da estética gay ao mesmo tempo que a subverte. A sequência inicial é filmada de forma a remeter a um momento pós-orgia e os rapazes aparecem quase sempre seminus. Ao contrapor isso com uma heterossexualidade bastante performativa, o mistério de como realmente se configuram os desejos desses jovens fica para o espectador. 
 
“Los Agitadores” não está tentando reinventar a roda e as conclusões a que chega podem até ser um pouco batidas – mas infelizmente continuam necessárias. O filme continua mostrando o fôlego de Berger em questionar como sexualidade e manipulação se entrelaçam. Nos olhares furtivos e desculpas esfarrapadas de seus personagens, o diretor argentino pinta um medonho retrato de homens sem maturidade emocional. 

Crítica faz parte da cobertura do Cine Set do Festival de Cinema de Karlovy Vary 2022.

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