O cinema de ação tem se beneficiado muito com a transição para o digital. Os inovadores usam o gênero para desbravar novos territórios – vide os drones de Michael Bay em “Ambulância”. Já o fim da limitação imposta pela duração do rolo de película facilitou a encenação de coreografias fluidas que investem na fisicalidade dos atores.

Isso significa dizer que os planos-sequência se tornaram lugar-comum no cinema de grande escala hollywoodiano; seja em “John Wick 4”, “Guardiões da Galáxia 3”, ou até mesmo em uma série como “Barry”, o plano-sequência se faz onipresente no mundo pop.

É nesse contexto que “Resgate 2” faz sua entrada triunfal no rol dos oners. O primeiro filme era algo como uma atualização de “Chamas da Vingança”, com o gringo lidando com os criminosos do terceiro mundo enquanto tenta resgatar uma criancinha inocente. A diferença é que no lugar das abstrações visuais da fase tardia de Tony Scott, o diretor e ex-dublê Sam Hargrave apostava em coreografias elaboradas, no combate bruto e, no principal momento do filme, em um plano-sequência tão longo que deixava o espectador exausto.

Todo o restante basicamente não funcionava; Chris Hemsworth é um performer notável, mas sua presença é melhor aproveitada em papéis cômicos; e, principalmente, a criança que eles arrumaram era terrível. Quando o filme precisava pisar no freio e deixar o garoto fazer o trabalho pesado, o bolso do celular começava a coçar.

SEQUÊNCIAS ESPETACULARES DE AÇÃO

No segundo filme, Hargrave conserta boa parte de seus erros. A trama é basicamente a mesma: Hemsworth vive Tyler Rake, mercenário que, desta vez, precisa resgatar uma família das garras de poderosos criminosos na Geórgia. O vilão, no entanto, é mais interessante, com direito a flashbacks e tudo, situando-o em um ciclo de violência inescapável.

O menininho da vez também é irritante, mas há um propósito narrativo para isso: dividido entre a fidelidade à família de criminosos e o amor pela mãe, ele ameaça colocar tudo a perder na missão de nosso herói. Se isso significa mais porradaria, então ótimo.

Porque a ação em “Resgate 2” também supera a do primeiro filme – o que já não era tarefa fácil. Mas Hargrave encara o desafio com confiança, e o resultado são duas das melhores sequências de ação do ano. A primeira delas, a invasão a uma prisão seguida de fuga da mesma, é um tour de force misturando diferentes técnicas cinematográficas em meio ao caos coreografado (atenção ao momento em que passamos da câmera na mão a uma snorricam, presa no corpo de Hemsworth enquanto ele vai ao chão – eu não consigo começar a imaginar como foi feita essa transição).

O desafio de atravessar uma prisão – e depois uma floresta numa perseguição, e depois os vagões de um trem – é não só físico: a sua duração é levada em conta. Pouco importam, nesse caso, os cortes escondidos com o auxílio de efeitos visuais, contanto que “Resgate 2” sempre aumente a intensidade do banho de sangue à revelia de nosso herói. Ele precisa expiar seus pecados para nosso divertimento, soco a soco.

MENOS SONO

Assim, é verdade que Hemsworth é melhor quando pode se curtir e bancar o bonachão, mas, pelo menos, ele pode demonstrar aqui seu verdadeiro alcance como performer de ação. Além do mais, quem não gosta de um homem que apanha e volta para mais um round? Na segunda sequência memorável do filme, ele tem até a chance de mostrar o quão matadora são suas séries na academia.

O que impede que este seja um exemplar memorável do gênero? Hargrave pode até estar melhorando no tratamento dos personagens, mas “Resgate 2” sofre do mesmo problema que seu antecessor: sempre que o filme pisa no freio para os personagens conversarem, o teste de paciência começa. Pensando bem, talvez seja até mais justo culpar os roteiristas e produtores, uns tais de Irmãos Russo, que, depois de receberem seu super-cheque da Marvel, foram cometer atrocidades cinematográficas às custas da Netflix.

Mas o sono dessa vez bate com menos força: tudo é competente o suficiente, mesmo que também seja genérico, para manter a boa-fé do espectador. No mais, é difícil pegar no sono depois de ver Chris Hemsworth esmagando a cabeça de um sujeito em um aparelho de musculação.