Em 2012, o mundo do cinema finalmente conheceu Seth MacFarlane. O humorista já gozava de prestígio no mundo de entretenimento da televisão, graças à sua cultuada série de animação “Uma Família da Pesada”. Sua estreia cinematográfica veio na forma de um conto irõnico – uma comédia para adultos – protagonizada por um urso de pelúcia boca suja e politicamente incorreto (dublado pelo próprio criador). Ted” foi a grande surpresa do ano, arrecadando uma bilheteria mundial de aproximadamente 550 milhões, transformando o ursinho em um fenômeno cult.

Já no posto de novo queridinho de Hollywood, MacFarlane não apenas foi escolhido para ser o apresentador do Oscar em 2013, como teve total liberdade pelos Estúdios Universal para desenvolver o seu segundo filme, uma paródia dos filmes de faroestes batizado aqui no Brasil com o título picareta de Um Milhão de Maneiras de Pegar na Pistola” (“A Million Ways to Die in the West”). O resultado é que este segundo trabalho acabou sendo um fracasso retumbante tanto de crítica quanto de público e, para piorar a situação, a participação do humorista como anfitrião no Oscar gerou mais críticas do que elogios.

Por isso “Ted 2” funciona como a prova dos nove: será que MacFarlane é refém da maldição do primeiro filme que assombra diversos diretores (podemos até citar um certo cineasta indiano que vive a sombra do seu grande sucesso comercial)? O sucesso do primeiro “Ted” foi um golpe de sorte? O resultado é que a continuação, que teve sua estreia nacional na última semana, fica no meio-termo: consegue ser ao mesmo tempo superior ao medíocre segundo trabalho do diretor, mas ainda se encontra distante do frescor e criatividade do filme original.

Desta vez, Ted está casado com sua amada Tami-Lynn. Enfrentando uma crise conjugal, ele acha que a solução para contornar o problema é ter um filho. Só que o Governo Americano acaba descobrindo sua existência, o proibindo de ser pai e anulando o seu casamento, pois considera Ted um objeto e não um ser humano. Entra uma jovem advogada (sai Mila Kunis e entra Amanda Seyfried como par romântico) que juntamente com o amigo John (Mark Wahlberg), vão tentar reaver os direitos de Ted.

“Ted 2” agrada principalmente por trilhar a linha temática do filme original, a mistura eficiente entre a ironia e escatologia – o roteiro expõe a cada minuto situações politicamente incorretas e grosseiras. Outra qualidade são as diversas referências a cultura pop e filmes que MacFarlane oferece ao público, seguindo a cartilha de Tarantino em homenagear os seus filmes favoritos. Neste ponto, o diretor atinge o seu objetivo: algumas piadas são ótimas, principalmente as que satirizam as comédias stand up e tiram sarro da Comic Con, além das cenas que prestam homenagens aos clássicos “Antes Só Que Mal Acompanhado”, “Clube dos Cinco”, de John Hughes, e Jurassic Park”, de Steven Spielberg.

Uma pena que o problema principal da continuação consiste naquilo que é a grande virtude do original: juntar a bagagem da cultura pop e suas celebridades com a trama principal do filme. No anterior, o conto do sujeito imaturo com dificuldade de relacionar-se como um adulto conseguia equilibrar o humor anárquico repleto de situações do mundo pop – do cinema, passando pelos quadrinhos até chegar à televisão.

A continuação, por sua vez, não contrabalanceia essas referências com o tema social sério principal (a discussão dos direitos civis), logo as piadas jamais funcionam em conjunto com o filme e sua história. Na verdade, MacFarlane tenta aproximar esta sequência do humor cínico e consagrado da sua animação “Uma Família da Pesada”, sem perceber que há um parâmetro de diferenças (e diria até enorme) entre televisão e cinema.

Esta irregularidade narrativa também se reflete no elenco: Wahlberg se torna infelizmente um coadjuvante de luxo em grande parte do filme. A entrada de Amanda Seyfried no lugar de Mila Kunis cumpre bem o papel, ainda que o roteiro falhe em construir o relacionamento amoroso entre ela e John. A participação especial de Morgan Freeman é decepcionante e a volta de Giovanni Ribisi como o vilão nada acrescenta ao enredo.

O resultado final, é que “Ted 2” funciona mais no seu individual – quando satiriza a cultura pop – do que propriamente no conjunto ou contexto geral. Há alguns picos de criatividade que perdem a força na narrativa previsível. MacFarlane, no fundo, recupera-se do golpe do seu filme anterior, mas ainda vive à sombra do seu filme de maior sucesso.

* Texto original alterado para substituir a equivocada expressão humor negro.