Particularmente, um dos meus subgêneros favoritos são dramas envolvendo o amor incondicional e a obsessão pela perfeição. Pode ser ao dançar balé, tocar piano, bateria, cantar ou desenvolver com maestria um talento para o qual se dedica uma vida. Gosto da ideia de mentor e aprendiz levados ao extremo em busca da tão sonhada glória.

 Filmes como “Cisne Negro”, de Darren Aronofsky ou “Whiplash”, de Damien Chazelle, principalmente em suas cenas finais, são belíssimas demonstrações desse sentimento de poder, glória e vingança, sensações sempre tão profundas. Em “The Perfection”, o diretor Richard Shepard (“Tokyo Project”) eleva o já conhecido drama aprendiz e mestre para um terror psicológico envolvente e macabro. Com reviravoltas, sangue e paixão, a produção original Netflix dá aos seus telespectadores, sejam amantes ou simpatizantes do bom terror, uma obra que não chega a ser um clássico, mas que te fisga do começo ao fim da projeção.

A trama conta a história de Charlotte (Allison Williams), uma violinista prodígio que precisou abandonar a carreira para cuidar da mãe doente. Dez anos depois, quando sua genitora finalmente morre, Charlotte retoma o contato com seu mestre Anton (Steven Weber), que agora já possui uma nova estrela, Lizzie (Logan Browning). No primeiro contato das musicistas, há a velha conhecida disputa velada, com toque sombrio e ambição, no entanto, nem tudo que parece é e, com o passar da história, vamos percebendo as motivações sórdidas de cada personagem.

“The Perfection” é uma obra idealizada e conduzida por Shepard como uma verdadeira orquestra. O diretor assina também assina o roteiro e a produção, porém, seu gosto refinado e sórdido está presente na trilha sonora, design de produção e fotografia, que investe nos tons de vermelho e amarelo, expressando o requinte de seus personagens e demostrando certo toque de insanidade que existem dentro deles.  No meio do primeiro ato, o diretor deixa claro que sua obra não se trata de terror esquecível ou cheio de jump scare, mas sim, repleto de cenas grotescas de sexo, obsessão e dor.

HOMENAGEM A ARGENTO E CLICHÊS

Destaque em “Corra”, Allison Williams, mais uma vez, oferece uma interpretação dúbia, entre os olhares e gestos angelicais e, ao mesmo tempo, cruéis. Na pele da protagonista Charlotte, a atriz merece todos os créditos ao fazer exatamente o que o roteiro propõe: induzir o espectador e levá-lo a crer em que tudo que está vendo em tela. É claro que os seus companheiros de tela merecem os créditos: Logan Browning, por exemplo, está muito bem, oferecendo aqui o seu melhor, criando ar de mistério e sexual em sua personagem. Gosto da atriz, apesar de achar que ela se perde um pouco nos momentos em que o roteiro e a direção pedem mais. O experiente Steven Weber, na pele do mestre, exerce um bom papel, sendo o dono das falas mais sórdidas e macabras, mas, para um veterano, o ator poderia ter ido além, com mais presença de cena e imposições. Ele não consegue desenvolver seu personagem a ponto de se tornar um grande antagonista.

A montagem do filme é pontual e a homenagem que Shepard faz ao clássico “Prelúdio para Matar”, de Dario Argento, com seus planos detalhes e desfocados, dão um toque todo especial ao filme. Pena que “The Perfection” não mantém seu ritmo regular até o final, entregando um desfecho cheio de furos, que dão um sabor amargo aos espectadores que estavam tão envolvidos durante o filme. Aqui, o roteiro inova em suas reviravoltas e atuações, mas nos entrega clichês e conveniências que até são aceitáveis, mas que deveriam deixar de serem repetidas a exaustão.

“The Perfection” é um bom filme e uma experiência cinematográfica que vale, principalmente, no mar de opções muitas vezes questionáveis que a gigante do streaming oferece.