Na Parte 1 deste artigo, abordei a inquietação que, às vezes, sinto, e muitos de vocês talvez sintam também, a respeito da duração dos filmes modernos. Hoje em dia, eles estão muito longos?

Fiz então uma recapitulação histórica para mostrar que filmes bem compridos sempre existiram. Houve épocas em que foram mais comuns, outras menos. Mas o que diz a ciência? Vamos ver…

A matemática da duração dos filmes

No começo deste ano, depois que foi revelado pela Warner que Batman teria quase 3 horas de duração, o site inglês The Guardian publicou um artigo perguntando justamente se os filmes estão ficando mais longos. Esse mesmo site buscou uma pesquisa feita por Przemysław Jarząbek. O analista de dados pegou o IMDb, o maior banco de dados sobre cinema da internet, dividiu os conjuntos de informações em três variáveis – ano de lançamento da produção, duração e número de votos no site para medir a popularidade do filme. Depois, ele deixou a matemática fazer sua parte.

O analista não encontrou respaldo matemático para dizer que os filmes estão ficando mais longos de fato. A pesquisa dele é interessante e até razoavelmente bem explicada. Ok, os filmes em geral podem até não estar ficando necessariamente mais longos. Mas e os blockbusters, aqueles filmes mais populares?

Quanto mais, melhor?

Harry Potter e as Relíquias da Morte - Parte II

Na Parte 1, observamos a lista dos 10 filmes de maior sucesso de 2021. A duração média do top 10 do ano passado é de 131 minutos.

E se voltarmos um pouco mais no tempo? Foi justamente o que fez o site What to Watch, que mediu a duração média dos filmes de maior sucesso nos EUA a cada 10 anos. De fato, ela indica uma tendência de aumento no tempo dos filmes mais populares.

Em 2011, a duração média foi de 122 minutos. Dos 10 filmes de maior sucesso de bilheteria, cinco duravam menos de duas horas:

  • Harry Potter e as Relíquias da Morte: Parte II: 2h10
  • Transformers: O Lado Oculto da Lua: 2h34
  • A Saga Crepúsculo: Amanhecer Parte I: 1h57
  • Se Beber Não Case: Parte II: 1h42
  • Piratas do Caribe: Navegando em Águas Misteriosas: 2h17
  • Velozes e Furiosos 5: 2h10
  • Carros 2: 1h46
  • Thor: 1h55
  • Planeta dos Macacos: A Origem: 1h45
  • Capitão América: O Primeiro Vingador: 2h04

Em 2001, a duração média foi de 126 minutos. Nesse ano fora da curva, a subida ocorreu devido à presença na lista de três pesos-pesados. Do top 10, de novo, metade durava menos de duas horas.

  • Harry Potter e a Pedra Filosofal: 2h32
  • Shrek: 1h30
  • Monstros, S.A.: 1h32
  • A Hora do Rush 2: 1h30
  • O Retorno da Múmia: 2h10
  • Pearl Harbor: 3h03
  • Jurassic Park 3: 1h32
  • Planeta dos Macacos: 1h59
  • Hannibal: 2h11
  • O Senhor dos Anéis: A Sociedade do Anel: 2h58

Voltando a 1991… A duração média era de 117 minutos! Só o vencedor do Oscar, Dança com Lobos chegou a três horas. Do top 10, sete filmes duravam menos de 2 horas.

E no ano de 1981, em plena ascensão da era do videocassete, a duração média foi de 110 minutos… Dos 10 filmes mais bem sucedidos do ano, sete duravam menos de 2 horas.

  • Superman II: A Aventura Continua: 2h07
  • Recrutas da Pesada: 1h46
  • Quem Não Corre, Voa: 1h35
  • 007: Somente para Seus Olhos: 2h07
  • The Four Seasons: 1h47
  • Excalibur: 2h10
  • A História do Mundo: Parte 1: 1h32
  • Rompendo Correntes: 1h34
  • A Grande Farra dos Muppets: 1h47
  • Amor Sem Fim: 1h56

O que pode explicar essa tendência?

Streaming, grandiosidade e a nova relação do público com o cinema

Já é óbvio dizer que o streaming modificou nossa relação com a obra cinematográfica. Hoje, o público tem uma variedade de opções para assistir, tanto em termos de filmes quanto de séries, e a relação que se estabeleceu com estas últimas deixou o público mais propenso a aceitar a narrativa longa.

A comparação “ah, mas as pessoas que reclamam da duração do filme X passam horas e horas maratonando série” é um clichê, e também é vazia, porque se trata de experiências diferentes. Mas, sem dúvida, hoje cineastas se sentem mais à vontade para alongar seus filmes, porque há uma tolerância maior do público.

O que não significa que não haja um lado negativo para isso. Pessoalmente, acredito que por causa desta tolerância, muitos espectadores hoje confundem “mais tempo” com qualidade. Quando vejo um produtor de série falando que sua nova atração é como “um filme de 13 horas”, já sinto vontade de correr para bem longe dela. Ora, há um motivo para filmes não durarem 13 horas: porque seriam insuportáveis. Enfim…

Voltemos àqueles casos isolados da Parte 1: Se tivessem que estrear no cinema, Martin Scorsese e Zack Snyder jamais conseguiriam lançar O Irlandês e Liga da Justiça, respectivamente, com as durações que eles têm hoje. Esses filmes foram pensados com a mentalidade do streaming, para um público que poderá pausar e retomar a experiência mais tarde. Não é algo que eu, particularmente, recomende: para mim, um filme tem que ser visto de uma sentada só, mas sei que sou um espectador de exceção.

Mas há outro aspecto no qual o streaming modificou a relação com o cinema: hoje, talvez mais do que nunca, as pessoas precisam de um motivo para sair de casa e ir à sala escura. Com tantas opções e depois de uma pandemia que fez muita gente se acostumar com a comodidade do lar e a praticidade de ter milhares de filmes ao alcance de um clique, é preciso um atrativo, uma força, para fazer o público em geral levantar o traseiro do sofá.

Para chamar as pessoas, os lançamentos de cinema hoje precisam ser épicos. Precisam ter uma grandiosidade, a experiência precisa ser mais poderosa do que se pode ter na sala com a Smart TV 4K. E a duração do filme contribui para isso. Ora, quem primeiro noticiou que Batman iria durar quase três horas? O departamento de marketing do estúdio Warner Bros.

Duração, assim como um trailer ou a presença de um astro, acabou virando um chamariz, um atrativo propagandístico, um indicativo para o grande público de que a experiência vale a ida ao cinema. Vingadores: Ultimato, além de ser a culminação de uma década do universo Marvel, também foi ajudado no marketing pela sua duração épica. Claro, era um filme que precisava de 3h03 para contar sua história, mas as filas e a correria para pegar as sessões concorridas ajudaram no boca-a-boca e na empolgação do público.

The End… Mas antes, uma ceninha pós-créditos

Depois de tudo isso, o que se pode concluir? Bem, a duração de um filme pode ser um elemento fílmico à disposição do cineasta, tal e qual a fotografia ou o figurino. Para alguns, faz parte do estilo e da forma como se expressam em sua arte – tem cineasta que só faz filme comprido. Por isso, filmes longos fazem parte da história do cinema e, felizmente, muitos ainda conseguem ser apreciados mesmo na era do TikTok e do consumo imediato de “conteúdo”.

A duração também pode fazer parte de uma estratégia comercial, um item a mais para convencer o espectador a sair de casa e gastar com gasolina, pipoca e ingresso. Ela passa a fazer parte da promessa da sala escura, uma que não se compara com os milhares de filmes insossos e esquecíveis presentes no catálogo de uma Netflix, por exemplo. E em um cenário em que a pandemia de Covid começa a ficar para trás, você pode esperar que cada vez mais estúdios e cineastas vão brincar com o tamanho dos filmes, sempre em nome dessa promessa.

E para concluir esse artigo, que ficou quase tão longo quanto Liga da Justiça de Zack Snyder, é sempre bom relembrar este comentário do diretor Jon Turteltaub, responsável por A Lenda do Tesouro Perdido (2004), que dura 2h11:

“Um filme não é bom ou ruim por causa da sua duração. Mas eu prefiro ver uma porcaria curta do que uma longa”.