Tá, Tom Cruise é um ator repetitivo (alguns diriam preguiçoso), que há anos só aparece como o mocinho em filmes de ação simplórios e pouco memoráveis. Mas bem que, de vez em quando, ele se arrisca. Seja de forma radical, como ao interpretar o sensual e egocêntrico Stacee Jaxx, em Rock of Ages (2012), seja ao tentar trazer vigor à (então) surrada franquia Missão Impossível (o quarto capítulo, de 2011, é o melhor de todos), o ator dá sinais, de tempos em tempos, de que não quer se fossilizar.

Eis, então, que ele aparece encabeçando a adaptação cinematográfica da quase-graphic novel Oblivion (quase, porque não chegou a ser publicada), dirigida por seu próprio autor, Joseph Kosinski. Mistura de ficção científica e romance, o filme traz efeitos especiais caprichados e mira nos clássicos da melhor fase do gênero, aquela da virada dos anos 1960 para 70: 2001 – Uma Odisseia no Espaço (1968), O Segredo de Andrômeda (1971), Solaris (1972), até mesmo Alien – O Oitavo Passageiro (1979) – e não, nada de Star Wars. Talvez, com um roteiro mais surpreendente, o filme até chegasse a ser comparado a essas obras-primas. Em vez disso, tem-se uma trama correta, capaz de entreter e até de oferecer um lampejo de reflexão, mas que ficou muito aquém da estatura almejada pelo diretor.

Jack Harper (não Reacher, que fique bem claro), interpretado por Cruise, é uma espécie de fiscal do planeta Terra, décadas após uma guerra terrível contra uma raça alienígena, que custou a perda da Lua. Com lembranças difusas do planeta pré-catástrofe, ele vive de consertar androides rastreadores e coletar pequenas quinquilharias, que talvez possam lhe dar mais pistas sobre essas memórias. Quando uma nave contendo astronautas adormecidos despenca por aqui, Harper conhece a bela cientista Julia (Olga Kurylenko), que logo revela ser a chave para que ele saiba o que realmente aconteceu à humanidade.

O bom mote é auxiliado por uma apresentação impecável. As paisagens arrasadas do planeta, as construções futuristas, até mesmo o design das roupas e veículos, todo o lado visual do filme é de uma riqueza fascinante, como realmente convém ao gênero, o que também é uma prova do capricho de seu diretor – o qual, não custa lembrar, estreou no cinema com o fracassado, mas também estonteante Tron: O Legado (2010). Em particular, o desenho dos drones é brilhante, realmente ameaçador. Acontece que as situações que se seguem, especialmente para quem é espectador contumaz de filmes de ação ou ficção científica, é bastante previsível. Sem esnobismo, qualquer pessoa mais habituada a esses dois gêneros saberá antecipar como Jack vai sair das suas enrascadas. A surpresa maior fica para a abordagem filosófica que o filme faz da questão da identidade, uma subtrama elegante que volta à história de tempos em tempos, trazendo complicadas decisões ao protagonista. Nesse sentido, o filme é o que chega mais perto do ótimo Sunshine – Alerta Solar, dirigido pelo inglês Danny Boyle em 2007, e que também fazia um retorno a esse lado mais ambicioso e existencialista da ficção científica. Já é um saldo muito bom, visto que o gênero tem apanhado em suas últimas “ressurreições” na telona (a mais recente, Prometheus, do diretor de Alien, Ridley Scott, foi escolhida por este escriba como a maior decepção de 2012).

O elenco, com Cruise à frente, está ótimo. O carisma do ator ajuda a fazer a trama andar em seus momentos mais monótonos, e Morgan Freeman, como o líder da resistência, Kurylenko, como Julia, e Melissa Leo, como a antipática “gerente” Sally, se saem muito bem. Mas quem tem maior destaque é Andrea Riseborough (de W.E. – O Romance do Século), como Victoria, a parceira de Harper no início da trama. Além de linda, a atriz mostra uma presença admirável em cena, impondo-se no papel de uma mulher terna e hesitante. Também vale citar a trilha sonora technopop do grupo M83, com seus timbres que ajudam a reavivar o passado extraordinário da ficção científica.

Resumo da ópera: um filme de visual fantástico, mas indeciso em suas pretensões, talvez sacrificado à necessidade de se fazer um produto para adolescentes, com um roteiro que esboça uma grande trama que não chega, de fato, a se realizar. Mas as ótimas referências e o apuro visual de Kosinki mais do que valem a conferida.

Nota: 7,0