O espetáculo “A Herança Maldita de Mercedita de La Cruz”, uma produção da Associação Cultural Apareceu a Margarida, teve apresentação especial no Teatro da Instalação, localizado na rua Frei José dos Inocentes, no Centro Histórico, após cinco anos de pausa. A peça foi parte da programação do festival de artes integradas #SouManaus Passo a Paço 2022, que aconteceu de 3 a 6 deste mês.  

Com dramaturgia escrita por Sérgio Cardoso, escritor e artista visual, e direção de Chico Cardoso, a peça estreou em 2006 no Teatro Amazonas e permaneceu em cartaz por dez anos em Manaus. O espetáculo rendeu prêmios à elaboração da dramaturgia e ainda teve apresentações nos estados do Rio de Janeiro, Amapá e Acre.  

Sob as estruturas do tradicional Teatro da Instalação, com todos os assentos ocupados, estava o público no aguardo no início de “A Herança Maldita de Mercedita de La Cruz”, que começou por volta das 19h30. Assim que as cortinas abriram, surge em cena a personagem que dá nome ao espetáculo; interpretada por Nivaldo Mota, acompanhamos uma mulher triste lendo um jornal da década de 1950, período do declínio econômico da borracha. 

No meio do cenário de manequins inacabados e retalhos de tecidos espalhados por todos os lados do palco, toca a música “Conversando No Bar”, cantada por Elis Regina, que ambienta emocionalmente o início do espetáculo em que a modista e proprietária da falida Casa Das Noivas, tece suas angústias sobre o esquecimento do seu trabalho como estilista dos casamentos das damas que pertenciam à elite manauense.  

Em seguida, o espetáculo tragicômico mostra as relações femininas conturbadas de Mercedita com a filha Agatha Turmaline (Arnaldo Barreto), uma escritora frustrada que nunca consegue terminar o seu livro intitulado “Amada Sem Rumo”; e com a neta Jessica Kristelly (Michel Guerreiro), que, pela decadência financeira da família, acabou se tornando uma meretriz, fazendo programas com os marinheiros dos navios que atracavam no Porto de Manaus, além de ter cometido um misterioso assassinato no passado nunca desvendado pela justiça local. Assim, acontece o desenrolar das tramas dessas três personagens mulheres de uma família esquecida e que sobrevivem nas beiras da classe elitista, no período de transição das décadas de 1940 para 1950 na cidade de Manaus. 

 RIVALIDADE ENTRE GERAÇÕES

Com diálogos que retratam os costumes caricatos e provincianos da sociedade amazonense, Mercedita é odiada tanto por Agatha como por Jessica, sendo apontada como o empecilho para o retorno de ascensão da família. Entre falas longas e um tanto cansativas, o elenco de atores tenta manter o ritmo da trama com bom humor apesar de, algumas vezes, ficar difícil acompanhar a linha de raciocínio da história da peça que se mantém compreensível pelo tom vocal e das expressões faciais feitas pelos atores.  

Estarem juntas para derrubar a matriarca não impedem Agatha e Jessica de também trocarem farpas uma com a outra e, muitas vezes, mostram ter uma relação de competitividade entre mãe e filha. Se Agatha sonha em concluir o seu livro e lançá-lo no Teatro Amazonas, além de ir até o Rio de Janeiro conhecer o presidente Getúlio Vargas, Jessica almeja viajar a Europa toda comprando várias joias e roupas de grife. A filha, aliás, passa a apresentação inteira sacando uma faquinha que fica presa em um suporte, em forma de cinto, amarrado na perna e faz o público rir de desespero, criando um clima de suspense bem-humorado.  

UMA MISSÃO INESPERADA

As deslumbradas Agatha e Jessica passam grande parte do espetáculo direcionando uma série de ofensas, ironias e muitas futilidades à matriarca. Esse tratamento das vilãs muda quando Mercedita de La Cruz recebe uma carta em forma de testamento da falecida irmã Iaiá, no qual deixa toda a sua herança para a falida estilista de noivas, incluindo, propriedades na Avenida Eduardo Ribeiro, nos entornos do Largo de São Sebastião e todo o bairro Aparecida. Entretanto, Mercedita apenas receberá essa rica herança com uma única condição: fazer a neta casar com o filho da sua falecida irmã Iaiá, o então Maurício Esteban (Hely Pinto). 

Sendo assim, acontece o casamento por interesse de Jessica com Esteban até que a faquinha dela entra em ação, gerando uma verdadeira serial killer manauara. Contar mais do que isso seria spoiler. Basta dizer que a última cena arranca altas gargalhadas que ecoaram no Teatro da Instalação. 

ELENCO

Jessica Kristelly (Michel Guerreiro)

Mercedita de La Cruz (Nivaldo Mota)

Aghata Turmaline (Arnaldo Barreto)

Maurício Steban (Hely Pinto)

FICHA TÉCNICA

Texto: Sérgio Vieira Cardoso

Direção: Chico Cardoso

Figurinos: Chico Cardoso e Fabiano Fayal

Produção Executiva: Michel Guerreiro

Apoio de produção: Dione Maciel

Iluminação: João Paulo

Pesquisa musical: Wallace Almeida

Operação de Sonoplastia: Geraldo Langbeck