Você começa “A Porta ao Lado” com boa vontade. Na tela, Mari (Letícia Colin) é a chefe de um restaurante. Ela divide um apê com Rafa (Dan Ferreira), com quem tem um relacionamento estável há anos. Mas a chegada de um casal pra frentex ao apartamento do lado entorna o caldo dos dois de pouquinho em pouquinho. 

Os novos vizinhos são Isis (Bárbara Paz) e Fred (Túlio Starling). O quão modernos eles são? Aqui vai um exemplo: no seu open house, Isis se agarra com outra na frente do parceiro. Isso é depois, inclusive, deles oferecerem MD ao casal comportado (e todo mundo sabe que MD é a droga dos não-monogâmicos…). 

Já deu para entender o que está em jogo aqui: os dois casais entram em rota de colisão e a intercessão entre seus desejos os levam a questionar suas relações. Então, de um lado, você tem a cozinheira, que é uma chata – e a essa altura pensamos que “A Porta ao Lado” também sabe disso. Ela logo vai se envolver com Fred, hippie de 27 anos perdido no tempo, que é sobretudo um boçal – e o filme definitivamente sabe disso, você pensa. 

Enquanto as fissuras no relacionamento de Mari e Rafa começam a despontar, você fica pensando que um pouquinho mais de estilo talvez não fizesse mal ao filme. Claro, algumas das observações sobre as dinâmicas do casal moderno (esse quadrado amoroso poderia ser mascote da passivo-agressividade conjugal) são interessantes, mas esse naturalismo com pretensões intimistas acaba soando mais engessado que qualquer coisa. 

PEQUENO PRAZER MÓRBIDO

Como o restaurante de Mari, “A Porta ao Lado” segue assim: competente, mas longe de genial – até um pouco sem sal, eu diria. De tempos em tempos, a decisão mais genérica do mundo é tomada pela diretora Julia Rezende – como a música melosa ao piano que insiste em tocar na trilha -, mas nada que ofenda. 

Daí o filme decide ligar o modo turbo e, em uma cena de discussão conjugal na cama, entrar em questões de gênero e raça de uma forma extremamente troncha. Agora você está zangado com “A Porta ao Lado”, porque percebe que ele era justamente, desde o início, um longa de apartamento. Você conhece esse termo dos seus tempos de graduação em cinema; era assim que alguns professores cansados se referiam aos filmes universitários sobre o que os alunos conheciam de melhor: questões existenciais de salas de estar. 

Esses, como você bem sabe, são os filmes mais cansados que existem, pretensiosos da forma que só um aluno de graduação é capaz. E você começa a duvidar se, por exemplo, o Fred é um boçal de propósito, ou se é o ator Túlio Starling que simplesmente não tem outra expressão que não sua cara de sonâmbulo. Você suspeita da segunda opção. 

Resta, talvez, um certo prazer mórbido em ver pessoas chatas se autodestruindo na tela. Nem Bárbara Paz e Letícia Colin têm muito o que fazer dessa vez, coitadas. A discussão climática entre Rafa e Mari acaba ganhando contornos de peça de ensino médio. 

A única certeza que resta é a de que “A Porta ao Lado” não ocupará mais seus pensamentos assim que você terminar seu texto para o Cine Set. Não é que o longa seja horrível, apesar dos pesares; ele só é medíocre, mesmo. Particularmente, culpo Julia Rezende.