Os primeiros sinais não são animadores: uma sátira ao mundo do “cinema de arte”, estrelada por astros dos tapetes vermelhos internacionais, e dirigida por dois realizadores já bem conhecidos dos festivais ao redor do globo. Quando, no primeiro segundo de filme, o logo do Festival de Veneza aparece (onde o filme teve sua estreia mundial), passamos a ter certeza: “Official Competition” é o típico filme que satiriza aquilo que, ao mesmo tempo, representa. 

Que o longa dos realizadores argentinos Gastón Duprat e Mariano Cohn não descambe de vez para o insuportável se deve, em grande parte, ao trio central da trama: Penélope Cruz, como a diretora Lola Cuevas; Antonio Banderas, como o astro/playboy de meia-idade Félix; e Oscar Martínez (que trabalhou com a dupla de diretores anteriormente em “O Cidadão Ilustre”), como o veterano dos palcos e das telas Iván. 

Trio estelar

“Official Competition” se inicia quando um milionário espanhol decide financiar a produção de um longa-metragem, escalando a diretora Lola para comandar a adaptação do livro de um ganhador do Nobel. Para os papéis centrais, Lola recruta, justamente, Iván e Félix, dois atores que se odeiam (a tensão vai fazer bem ao filme, ela diz). O que se segue a partir daí é uma série de vinhetas cômicas explorando a futilidade do luxuoso mundo das artes. 

Bom, e quem de nós já não estava ciente da leviandade desse mundo? É o tipo de coisa que, francamente, não tem razão de existir em um filme (por outro lado, alguma coisa tem?). Antes, as diferentes e sutis modulações que o trio de atores encontra para trazer à tona o egocentrismo de seus personagens fazem a empreitada valer a pena. 

Tome Banderas como exemplo, que, como o cabeça oca Félix, parece sempre prestes a se inclinar na direção de qualquer um que argumente com aparente propriedade; ou Martínez, que demonstra habilmente como a pose professoral, bem como os discursos sobre ética, de seu Iván não passam de subterfúgios para seu orgulho profundo. 

Luxo absurdo

Apesar de todas as reiterações óbvias sobre o vazio da indústria que retrata, “Official Competition” consegue ser frequentemente bastante engraçado. Isso se dá porque o senso de absurdo dos realizadores – que escreveram o filme ao lado de Andrés Duprat – é ancorado pelas suas composições visuais. Em dado momento, por exemplo, Lola conduz um ensaio com seus atores sob uma gigantesca pedra de cinco toneladas, que paira sobre suas cabeças com o auxílio de um guindaste. Em outro, Iván e Félix são enrolados, da cabeça aos pés, em papel-filme. 

Tais gags visuais são frequentemente apresentadas em planos abertos e em profundidade de campo, de modo distanciado, seco. Isso acaba por ressaltar, por um lado, a opulência dos espaços onde os personagens transitam e, por outro, o absurdo das situações que criam. 

São cenas engraçadas, sustentadas por um trio afinadíssimo, mas não muito mais que isso – o que seria ótimo se não ficássemos com a sensação de que os diretores acreditam na suposta importância de sua sátira. Há momentos em que “Official Competition” para e se prolonga sobre uma faxineira ou um mendigo, personagens à margem daquele mundo de opulência, vivendo nos detritos de toda aquela vaidade. Mas tudo parece da boca para fora; fica a suspeita de que, no fundo, os diretores até que gostam da suntuosidade do mundo do cinema. 

E quem poderia culpá-los? Afinal de contas, o mundo da arte é horrível e frívolo, mas, rapaz, como eu queria tomar um solzinho em Cannes todo ano.

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