O que acontece quando uma atriz e um cineasta que já viveram dias melhores nas suas respectivas carreiras se encontram no meio de uma pandemia? Eles fazem um filme, ora. Um que, por motivos de produção, só conta com essa atriz e uma equipe reduzida de filmagem durante quase toda projeção. Foi o que aconteceu com The Desperate Hour, união da atriz Naomi Watts (“O Chamado”, “Cidade dos Sonhos”) com o diretor Phillip Noyce (“Salt”). O resultado é mais um filme esquecível da carreira de ambos.

O pior é que The Desperate Hour até tem uma boa ideia como base. Watts vive Amy, uma mulher que perdeu o marido em um acidente e luta para criar seus dois filhos, sendo que o mais velho, Noah (Colton Gobbo), é adolescente e está deprimido. Em um belo dia, Amy sai para fazer seu jogging matinal. Nos primeiros minutos, a vemos correndo pela trilha do bosque e resolvendo seus problemas do trabalho pelo telefone até que algo assustador acontece e Amy passa a ter que lutar para salvar o filho de um atirador na escola dele. E precisa fazê-lo pelo celular.

A ideia é boa e o filme se desenvolve em tempo real pela maior parte da duração. Mas Noyce nunca consegue criar a atmosfera de tensão que a história exige para funcionar. Não há intensidade nem no uso da câmera nem na montagem. É interessante como, quando o desespero de Amy começa, o diretor utiliza um plano do alto, de drone, para ressaltar o quão pequena a protagonista é diante do desafio. O problema é que ele repete esse mesmo plano mais uma meia dúzia de vezes só na primeira metade. O que resta a Noyce é apelar para uma trilha sonora intrusiva para forçar as emoções e, claro, confiar na sua estrela.

RESPONSABILIDADE NAS COSTAS DE WATTS

Não adianta, porém, colocar todo o peso dramático nas costas de Watts porque, por melhor atriz que ela seja, fica simplesmente enfadonho acompanhar um filme no qual uma personagem só corre e fala pelo telefone quase o tempo todo. A estrela se esforça, mas o roteiro não a ajuda, fazendo a tropeçar na floresta, pelo menos, duas vezes e forçando-a um voice-over constrangedor quando ouvimos seus pensamentos. repassando informações que o público acabou de ouvir enquanto Amy quase desmaia.

Quando “The Desperate Hour” se aproxima do final, o tom aumenta um pouco, com alguns (poucos) personagens aparecendo. Mas o resto do elenco não ajuda: Gobbo é muito inexpressivo e o atirador (Andrew Chown) não passa nenhum senso de ameaça – são duas atuações bem fracas, captadas pelo celular. E, no desfecho, o filme segue a trilha de um Supercine qualquer, encerrando-se de forma completamente previsível.

Em algum lugar de The Desperate Hour, há um comentário interessante sobre como hoje em dia fazemos tudo e vivemos pelo celular. Ou sobre o horror de viver numa sociedade onde, a qualquer momento, jovens podem atirar em outros com armas dignas de serem usadas em uma guerra. Mas tudo isso se dilui diante de uma produção que, apesar de até ser esforçada, nunca consegue engajar, nunca consegue nem de longe ser tão poderoso quanto uma experiência dessas seria realmente.

E é também uma triste constatação de como estão as carreiras de Noyce e Watts. O primeiro nunca chegou nem perto de se tornar um grande diretor, mas fez alguns filmes bons lá atrás, como Terror a Bordo (1989) e seus longas do agente da CIA Jack Ryan, Jogos Patrióticos (1992) e Perigo Real e Imediato (1994). Nenhum é um clássico do cinema, mas funcionavam no que se propunham: entreter o espectador. E Watts, exceto pela sua participação no revival de Twin Peaks em 2017, só tem feito bombas ou filmes no máximo medianos nos últimos tempos. O encontro dos dois não foi frutífero, e o distanciamento social óbvio que se observa durante “The Desperate Hour” reflete a frieza e a indiferença que o filme desperta.

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