Mesmo dissecada ante os olhos do novo milênio, a imagem do caubói americano continua a oferecer um vasto panorama para a ficção. “Domando o Destino”, novo filme de Chloe Zhao, nem é exatamente ficção, mas um poderoso híbrido que mistura boas atuações e histórias reais em uma releitura do mito americano.

O longa se debruça no drama de Brady (Brady Jandreau), jovem pobre dos descampados da Dakota do Sul, que vê a sua carreira no circuito local de rodeios ser subitamente interrompida depois que uma violenta queda durante uma competição lhe causa dano cerebral e limitações motoras. Desprovido dessa atividade, ele é obrigado a confrontar a sua condição em busca de um propósito.

As comparações com “O Segredo de Brokeback Mountain” vêm fácil – como Ang Lee, Zhao também é egressa da China -, porém, onde o filme de Lee é poético, Zhao mira em uma forma de realismo que encontra certos ecos no cinema neorrealista italiano do pós-guerra. A história do protagonista é real e interpretada pelo próprio com um detalhismo tocante. Sua família e seu círculo também aparecem, em versões levemente ficcionalizadas de si próprios, imbuindo as cenas com um senso ainda maior de realismo.

De todos, o mais impressionante é Lane Scott, um parceiro de Brady que, em um acidente não muito diferente do seu, é confinado a uma cadeira de rodas, sem controle dos próprios movimentos e impedido até mesmo de falar. Para o protagonista, Lane é um lembrete da sua própria mortalidade – a mesma que ele insiste em desafiar quando decide retomar a carreira a despeito dos avisos médicos que ele pode morrer ao fazer isso.

É difícil dizer se há algo no discurso de “Domando o Destino” que busca fazer um comentário sobre os Estados Unidos do governo Trump, mas ele certamente quer falar abertamente sobre a vida das pessoas que parecem esquecidas por qualquer gestão e também – como de praxe num filme sobre caubóis – sobre a noção de masculinidade mantida em comunidades isoladas.

Há uma fragilidade inata aos personagens de Zhao, a maioria jovens sem perspectivas que não acham possuírem talentos especiais, passando os dias bebendo e esperando os próximos rodeios. Eles, no entanto, se sentem empoderados quando estão diante de uma plateia dominando um animal feroz. A dicotomia entre o cara sensível que cuida da irmã com autismo e se preocupa com a família e com os animais e o corajoso esportista que precisa se provar diante dos seus pares mesmo com uma condição clínica grave está no centro de um filme que cativa o espectador e não poupa no drama.

Ao evitar conclusões fáceis para a sua investigação do caubói contemporâneo, Zhao se firma como um talento emergente e entrega um filme tocante e cheio de nuances, cujas recompensas vêm ao encontro do espectador da mesma forma que vão aos protagonistas: a galope.