Vencedor do Tigre de Melhor Filme do Festival de Roterdã e escolhido para representar a Índia na categoria de Melhor Filme Internacional do Oscar 2022, a estreia do diretor P.S. Vinothraj em “Pedregulhos” é um ótimo exemplo de como o cinema indiano merece ser reconhecido e apreciado. O filme também fez parte da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.
O longa-metragem é ambientado no sul da Índia onde estão localizadas duas aldeias. Em uma delas vive Ganapathy (Karutjtadaiyan), um homem alcóolatra, arrogante e movido por uma raiva que chega a ser doentia. A trama se inicia após Ganapthy, acompanhado de seu filho (Chella Pandi), decidir buscar a esposa que fugiu para outro vilarejo com medo do comportamento abusivo de seu marido.
Personagens engolidos pelo vazio do deserto
É nítido o conhecimento que o diretor possui da locação, pois, Vinothraj consegue explorar ao máximo a ambientação do deserto entre essas duas vilas: o vazio, o calor e a pobreza são elementos que recheiam e provocam inquietações no espectador.
Com isso, pode-se até estabelecer uma leve comparação às produções brasileiras do Cinema Novo ao abordarem a pobreza do sertão nordestino, como por exemplo, a luta pela sobrevivência de uma família de retirantes do Nordeste, na adaptação cinematográfica de “Vidas Secas”, de Nelson Pereira dos Santos.
Ainda que as motivações sejam divergentes em “Pedregulhos”, Fabiano e sua família tanto quanto Ganapathy e seu filho percorrem um caminho longo e cheio de obstáculos, empecilhos por onde passam.
Excelência narrativa e técnica
Esse resultado só é possível graças aos olhares precisos de Vignesh Kumulai e Jeya Parthiban na direção de fotografia ao posicionar a câmera em enquadramentos estratégicos. Há diversas cenas em planos abertos que evidenciam a magnitude do deserto em comparação aos moradores do vilarejo que lá transitam.
Outro ponto que enriquece o ritmo da narrativa é a montagem de “Pedregulhos”. Com poucos diálogos entre os personagens, Vinothraj decide apresentar, pelo menos, três cenas em plano-sequência. A montagem “sem cortes aparentes” elevam ainda mais a carga dramática das cenas. Vemos um simples conflito entre famílias se tornar uma grande cena de tensão, aos olhos de uma criança confusa e com medo – neste caso do filho de Ganapathy.
O trabalho de som também é digno de reconhecimento, especialmente, na primeira cena em que Ganapathy demonstra seu comportamento abusivo ao provocar uma briga dentro de um ônibus. Vemos a câmera seguir lentamente de fileira em fileira até chegar em uma mãe com um filho no colo. Durante esse movimento a presença do barulho da discussão fica em segundo plano até o som “explodir” junto com o choro do bebê ao acordar devido à confusão no transporte coletivo.
“Pedregulhos” pode não ter um enredo com subcamadas ou desenvolvimento de personagens complexos. Porém, a forma como Vinothraj apresenta a história de uma família que precisam dar conta de conflitos internos e ainda dar criar soluções para vencer a pobreza e desigualdades sociais, já valem a pena toda a experiência.
Se já em seu primeiro trabalho o diretor conseguiu cumprir com este propósito, seria interessante ficarmos de olhos no que Vinothraj e novos diretores indianos poderão trazer em futuras produções.