“As Linhas da Minha Mão” me fez pensar em alguém que conheço, Anna Paula – o que é um inconveniente, porque eu e Anna Paula estamos brigados no momento. Na sua protagonista, a atriz Viviane de Cassia Ferreira, estão os hábitos “canabísticos” de Anna Paula, o seu anseio performático, sua espiritualidade, seus orixás, suas cartas de tarô. 

No rosto de Viviane – ela fala sorrindo, e sorri mostrando toda sua arcada dentária; suas sobrancelhas são finas e delicadas e seus olhinhos, brilhantes –, em seu rosto estão também as ruas de BH e a praça Raul Soares, que daqui para frente sempre me lembrarão da Anna Paula. 

Mas Viviane também sou eu quando fala da sua “fragilidade psíquica”, ou quando diz que, em meio a um episódio de crise bipolar, “as pessoas que nos amam não tão sacando quem a gente é”. 

Ela sou eu quando diz, também, que está sempre em guerra quando está performando – e é também Leonard Cohen nesse momento, que cantava que “há uma guerra” e batia continência ao público em seus shows nos anos 70. 

Viviane é, ainda, uma atriz: há uma sequência embasbacante em que posa para câmera sob a chuva, sombrinha em mãos e cigarro na boca, parecendo, ao mesmo tempo, Audrey Hepburn e Norma Desmond

Documentário de João Dumans (“Arábia“), “As Linhas da Minha Mão” é uma revelação. Em uma abordagem que lembra os retratos cinematográficos de Paula Gaitán, com longas passagens em que Viviane narra suas vivências para um interlocutor atrás da câmera, convivemos por 80 minutos com essa artista. Tudo que o filme nos pede é que entremos na mesma frequência da voz de Viviane. Uma vez sintonizados, é impossível desviar o olhar. 

Esse filme me fez pensar em mim e Anna Paula, um inconveniente prazeroso, já que estamos brigados (etc e tal). Provavelmente vai te fazer pensar em si mesmo, e sobre ele e sobre ela e sobre nós. Nada de chocante aí: Viviane contém multidões.