Entre tantas características marcantes, uma que salta é que Isabelle Huppert tem “olhos de Bette Davis”. O que a francesa faz com quem a assiste é o mesmo que a estrela do icônica ‘A Malvada’ fazia: deixa mal, provoca, fascina, sabe exatamente o que é o poder que tem – como canta Kim Carnes em “Bette Davis Eyes”. A também icônica Huppert completará 70 anos em 16 de março de 2023 e não para de trabalhar, tanto que celebra a nova idade com mais um filme nos cinemas brasileiros: o drama com tintas cômicas “Belas Promessas”, de Thomas Kruithof. 

Huppert não é só o chamariz do filme: ela é a protagonista e alma da trama (um tanto quanto mal ajambrada no roteiro e na montagem) de uma política que quer ser fiel a si mesma, mas, que não resiste ao poder conquistado ao longo de árduos anos dedicados a vida pública. Esta é Clémence Collombet, prefeita de Saint Denis, uma das maiores cidades francesas, ainda que muito empobrecida, localizada na periferia da capital, Paris.  

“Belas Promessas” foca na dinâmica entre Collombet e seu principal assistente pessoal, Yazid Jabbi (Reda Kateb), chefe de gabinete de origem humildade e imigrante. O principal ponto de tensão entre os dois é a promessa eleitoral feita por ela de melhoria de um gigantesco conjunto habitacional, praticamente um bairro, na cidade. A prefeita, entretanto, talvez tenha que abdicar da sua visão de mundo quando recebe um convite para assumir um ministério no governo francês.  

FIDELIDADE À HUPPERT 

E aí Huppert consegue equilibrar bem demais a composição taciturna, mas ainda assim humana da política honesta e até competente, exausta de ter que se provar todo dia em um meio tão predatório. São justamente estes dilemas que movimentam a trama de “Belas Promessas”. A questão é que talvez o diretor Kruithof careça de ambição – ele está longe de ser um Claude Chabrol, cineasta com quem Huppert fez alguns de seus trabalhos mais célebres como “Madame Bovary”. 

Em “Belas Promessas”, Kruithof faz um trabalho pálido ao não conseguir colocar sua estrela no patamar que ela merece; a história não engaja tendo tantas subtramas que não levam a lugar algum, incluindo, as relativas à suposta sucessora de Collombet, dos moradores do conjunto residencial que buscam acionar a mídia e conseguir atenção ou mesmo de Jabbi tentando fazer a coisa certa. 

Ao fim, fica a certeza de que qualquer coisa com Huppert merece uma conferida, pois ela sempre busca, há décadas, refinar a atuação e no seu caso trabalho demais não implica qualidade de menos. Tanto talento rende uma ou duas cenas interessantes em “Belas Promessas”, principalmente, próximo ao desfecho (bastante óbvio). Se esse filme é especialmente sobre lealdade e fidelidade a si própria, declarada está a fidelidade à Isabelle Huppert hoje e sempre.