Certos nomes ganham projeção em Hollywood sabe Deus como e começam a emplacar uma série de importantes trabalhos – e quando digo importantes refiro-me a obras premiadas na Awards Season e não por serem boas. Anthony McCarten é a bola da vez: depois de “A Morte do Super-Herói”, adaptação do próprio romance, fez “A Teoria de Tudo”, “O Destino de uma Nação”, “Bohemian Rhapsody” e “Dois Papas”.  

Exceto pelo longa comandado por Fernando Meirelles realmente muito bom, as demais produções possuem roteiros burocráticos, dependendo do carisma dos retratados, das boas atuações dos protagonistas (exceto Malik) e, no caso do filme sobre o Queen, das músicas icônicas para não serem esquecíveis. 

Anthony McCarten repete a fórmula em “I Wanna Dance With Somebody: A História de Whitney Houston”. Desta vez, porém, não há Naomi Ackie, maquiagem, penteado, figurino e direção de arte excelentes capazes de livrar o filme de uma mediocridade gritante. Poucas vezes uma cinebiografia se pareceu tanto como uma página da Wikipédia pela superficialidade proposta. 

COLCHA DE RETALHOS 

Durante 157 minutos, o público presencia um apanhado da trajetória da estrela sem maiores detalhes: do começo na igreja ao lado da mãe para virar uma cantora com o disco no primeiro lugar das paradas, por exemplo, não demora 45 minutos. Além de dar a sensação de que tudo pareceu fácil (pelo menos, na parte inicial), a escolha pelo dinamismo cria uma colcha de retalhos de situações e causos com uma série de informações despejadas de forma aleatória – sempre há algum personagem para dizer que ela bateu o recorde X, está em primeiro lugar por Y semanas ou que a performance será como escalar o monte Everest sem oxigênio.  

Pior mesmo são situações relevantes inseridas subitamente e resolvidas como um passe de mágica. As críticas da comunidade negra de não se sentir representada por Whitney Houston, por exemplo, são quase incompreensíveis por simplesmente nunca ficarem claras, gerando uma resolução simplista – o lançamento de um disco de R&B soluciona tudo. McCarten dilui ainda outras tensões como o romance lésbico com Robyn (Nafessa Williams). “I Wanna Dance With Somebody” praticamente ignora como o relacionamento foi visto pela família religiosa, sendo restrita, no máximo, a uma discussão com o pai a partir de uma capa de jornal sensacionalista.  

FALTA INSPIRAÇÃO 

Há uma tentativa de guiar todo o drama a partir das relações da cantora com os personagens masculinos que a rodeiam, funcionando apenas com o explorador pai (Clarke Peters) e falhando miseravelmente com Bobby Brown (Ashton Sanders), aqui tratado como um simples mulherengo em vez do agressor revelados pela própria Whitney Houston em entrevista a Oprah Winfrey. Quanto a Stanley Tucci interpretando o lendário empresário Clive Davis, somente a última cena salva. 

Vinda do regular “Harriet”, a diretora Kasi Lemmons prova novamente ainda não ter personalidade suficiente para conseguir dar uma identidade ao filme – e em um ano com Baz Luhrmann e “Elvis” isso fica gritante. Como se não bastasse, precisamos ora aturar o mais do mesmo de cinebiografias musicais (o show final é uma amálgama de obras do gênero) ora momentos constrangedores (o hino norte-americano no Superbowl com soldados e pessoas ao redor do planeta vibrando com a apresentação de Whitney é forçar a barra demais).  

Diante deste caos e falta de inspiração, sobra se satisfazer com os hits melosos, o vozeirão inquestionável de Whitney Houston, Naomi Ackie lutando para dar o mínimo de dignidade e as divertidas recriações de clipes icônicos como “It’s Not Right But It’s Okay”. Pouco para um dos maiores ícones da música pop mundial.