“Mundo Estranho” chegou ao Disney+ da mesma maneira despercebida como estreou nos cinemas. Pouco marketing, nenhuma repercussão junto à crítica e ao público de modo geral. É quase como se não existisse ou a intenção era mesmo ficar escondido. A animação de Don Hall (diretor do oscarizado “Operação Big Hero” e do bom “Raya e o Último Dragão”) realmente passa longe dos melhores momentos do estúdio do Mickey ainda que possua um mérito inegável. 

O filme acompanha a história da família de exploradores Clade liderada pelo patriarca Jaeger. Ao lado do filho, ele tem como principal objetivo de vida ir ao outro lado da montanha que rodeia o pequeno vilarejo de Avalônia. Em uma das aventuras, o rebento Searcher descobre uma fonte de energia poderosa capaz de transformar a vida da cidade e decide voltar a contragosto do pai. Mais de 25 anos depois, Searcher ao lado do filho Ethan e da esposa precisaram embarcar em uma nova aventura devido a uma crise energética que ameaça a todos. O local da missão, entretanto, é completamente diferente da nossa realidade. 

CORAGEM E NATURALIDADE 

Com apenas 1h42 de duração, a animação aborda questões complexas como o conflito de três gerações e suas diferentes visões de mundo, a crise ambiental e energética, a nossa atuação na defesa do planeta e ainda um subtexto delicado de ter o primeiro personagem abertamente gay da história em um longa da Disney. Este último ponto, aliás, é, de longe, o maior dos acertos, pois, o faz com coragem e sem meias palavras, introduzindo o tema como mais uma das etapas da jornada de crescimento e independência do própria Ethan.  

E tudo isso sem parar a trama para um discurso motivacional ou explicativo: chega a ser curiosa a naturalidade de como os demais personagens tratam o bonito relacionamento em comparação aos choques vistos do lado de cá por meia dúzia de reacionários, causando uma inevitável ironia de qual lado da tela realmente estaria o mundo estranho. 

PRESSA EXCESSIVA 

Uma pena, porém, que todos os demais temas não consigam ter o mesmo vigor. “Mundo Estranho” deixa os embates entre as gerações emparedados pela necessidade de acelerar o ritmo para sequências de ação a cada três ou cinco minutos. Isso provoca o inevitável afastamento dos traumas, frustrações e desencontros de Jaeger, Searcher e Ethan, personagens com potencial para conquistar a todos, mas, que se tornam distantes no decorrer da história. Vale observar como o reencontro de pai e filho após 25 anos se mostra completamente vazio de emoções, inclusive, com direito a um corte abrupto para as aventuras de Ethan.

Sem figuras carismáticas para nos conectarmos, fica difícil abraçar qualquer discurso proposto por “Mundo Estranho”. Isso se agrava ainda mais por conta da ineficiência do roteiro de Hall e Qui Nguyen em apresentar os dilemas apresentados pelo filme tanto do ponto de vista de matrizes energéticas (assunto espinhoso para uma animação, diga-se) quanto ambiental. Ainda que a virada oferecida na reta final seja interessante a ponto de enriquecer toda a construção visual daquele universo até então e casar com a proposta de ausência de um vilão específico, como Ethan aborda no jogo de tabuleiro ao lado do pai e avô, a execução acaba sem o impacto necessário novamente por conta da pressa excessiva.  

Mesmo com o mérito da coragem em trazer a temática LGBTQIA+ de forma tão bem-trabalhada, no fim das contas, “Mundo Estranho” encerra um ano para esquecer da Disney – exceto por “Red”, o estúdio errou em praticamente tudo o que tentou nos cinemas e streaming. Uma aventura com homenagens aos clássicos do gênero das telas, revistas pulp e HQs dos anos 1950 sem muita vida.