No pequeno mundo da fortuna cinéfila, o jovem carioca Leonardo Martinelli conseguiu algo digno de nota: gerar um hype a cada novo lançamento no circuito de festivais. Como? Com uma carreira internacional exemplar para cada um de seus curtas. “Fantasma Neon”, de 2021, chegou até a obter distribuição nas salas de cinema, feito raro para um curta-metragem. E tome Kikitos e Troféus Redentor para adornar sua estante ao lado dos prêmios internacionais.

Tudo isso é ainda mais espantoso quando se percebe que Leonardo Martinelli é possivelmente o cineasta mais insosso de sua geração. Como explicar o sucesso, então? Serei o primeiro a admitir que o carioca sabe enquadrar. Ainda assim, fica sempre a sensação de que suas composições são um pouco polidas demais, calculadas. O mesmo se pode dizer do modo como o cineasta aborda questões sociais: sem dizer nada de muito duro, tomando todo o cuidado para evitar controvérsias, apelando sempre ao “bonitinho”. Enfim, estamos longe da estética e fundo na cosmética.

Talvez seja justamente esse caráter envernizado, social-pop, que garanta a aceitação de Martinelli no rol ilustríssimo dos mais importantes curta-metragistas do mundo: funciona para quem vê de longe. Para quem vê de perto, no entanto, seu maneirismo parece apenas piegas. Nesse caso, como explicar seu reconhecimento nacional? Admito: não posso, a não ser que apele para algum tipo de histeria coletiva dos críticos brasileiros ou parta do princípio de que todo festival encontra sua razão de ser dentro de alguma bolha besta e esclarecida.

Percebo agora que sequer mencionei o filme do qual esta crítica teoricamente trata: “Pássaro Memória”. Pois bem, está aí o filme. É bem enquadrado. Espectadores cariocas notarão o campus Maracanã da UERJ como uma das locações. As estreitas e históricas ruas do Centro, fetiche de Martinelli, também estão aqui, bem como a passarela que liga a Mangueira ao Maracanã. Minha fruição do curta vai até onde reconheço os locais de filmagens.

Perambulando por esses cenários, uma jovem procura pelo seu pássaro. O nome da ave? Memória. Sim, porque Memória esqueceu o caminho de casa. Se esse é o tipo de jogo de palavras que te apetece, eu tenho o filme para você.

Leonardo Martinelli parece ter todas as referências certas e as melhores intenções do mundo, mas o inferno já nos ensinou o que acontece com as boas intenções. Mais especificamente, Martinelli quer falar da fantasia do cotidiano, mas o rapaz é bem-comportado demais para se deixar levar pelas possibilidades do cinema.

Talvez seja este tipo de texto belicoso que tenha levado um colega curador a me descrever como “você que adora reclamar”. Como não quero dar mais pano para manga, encerro dizendo apenas mais uma coisa: o Rio de Janeiro merece um cineasta mais apaixonado do que Leonardo Martinelli.