Há quem diga que o Festival de Cannes inicia a temporada de premiações com os primeiros candidatos ao Oscar sendo colocados à prova. Não chego tão longe assim, mas, admito que o evento na França pode ser um bom ponto de partida para muitos filmes e atores. Que o digam “Parasita”, “Anatomia de uma Queda” e “O Triângulo da Tristeza” nos últimos anos. 

Neste novo vídeo do Cine Set, eu apresento quem sai bem, mal e na mesma do Festival de Cannes 2024. 

QUEM SE DEU MAL

Antes de falar quem pode chegar forte no Oscar, teve a turma que, infelizmente, ficou pelo caminho. O principal deles é um gênio do cinema mundial. 

Cannes confirmou as primeiras impressões de uma sessão exclusiva de que “Megalópolis” seria divisivo. E pela reação da crítica e de quem esteve na França realmente foi: o paralelo traçado por Francis Ford Coppola entre o Império Romano e os EUA atual em uma reflexão sobre o tempo e o próprio cinema do mestre levou muita gente a amar assim como odiar a obra. Com a dificuldade de conseguir distribuição, a tendência é que não será no Oscar 2025 o retorno da mente por trás da trilogia “O Poderoso Chefão”. 

O Paul Schraeder e o David Cronenberg não possuem as melhores relações com a Academia e a tendência é que as coisas permaneçam assim: “Oh Canadá” e “The Shrouds” não causaram maior comoção, ainda, é verdade que o segundo tenha recebido elogios. Devem passar bem longe de qualquer oportunidade na Academia. 

“Motel Destino” também sai de Cannes por baixo na disputa pela vaga brasileira ao Oscar 2024. O thriller erótico do Karim Ainouz recebeu boas críticas, mas, não foi tão arrasador a ponto de se colocar como candidato indiscutível. Para piorar, diferente de “Bacarau”, não foi premiado. 

E neste ano vale lembrar que há a chegada de “Ainda Estou Aqui” no segundo semestre com a dupla Walter Salles e Fernanda Montenegro repetindo a dobradinha de “Central do Brasil”. Se o filme for bem em algum festival forte como Veneza ou Toronto, “Motel Destino” fica em situação bem complicada pela vaga. 

NO MEIO DO CAMINHO

Pulando agora para a turma que ficou na mesma está “Parthenope”: apesar dos elogios, o filme do Paolo Sorrentino ficou sem prêmios. O acerto com A24 para a distribuição no mercado norte-americano e o carinho da Academia com ele, entretanto, amenizam o cenário. Se a Itália não optar por outro candidato, chega com credenciais fortes para ficar com uma das cinco vagas em filme internacional. 

“Bird” foi o primeiro filme a surgir com potencial de Palma de Ouro na edição deste ano. No fim, acabou sem nada. Se ficou sem o impulso de uma conquista, a recepção bastante elogiosa e emocionada com que o drama foi recebido pode ganhar força na Academia. Dependerá, claro, se a MUBI terá força para uma campanha pesada. 

Se “Tipos de Gentileza” não conseguiu repetir o feito de “Pobres Criaturas” em Veneza, não dá para dizer que a produção da Searchlight Pictures foi mal. O novo Yorgos Lanthimos recebeu bastante elogios com sua trama antológica e ainda viu o Jesse Plemons ganhar Melhor Ator. Tudo aponta que ele finalmente chega forte para a primeira indicação na categoria principal. 

QUEM SE DEU BEM

Aliás, o Festival de Cannes 2024 apontou mais potenciais candidatos para os prêmios de atuação do que necessariamente Melhor Filme e Direção.  

Interpretando Donald Trump em “O Aprendiz”, o Sebastian Stan provou como este é o ano dele. No início de 2024, ele já havia vencido Berlim com “A Different Man”. Pode até não ter saído com prêmio, mas, foi de longe o mais elogiado do filme do Ali Abbasi. 

Também não dá para falar do festival deste ano sem citar Demi Moore. A estrela brilhou em Cannes com o chocante “The Substance”. Claro que o terror da Coralie Fargeat pode ser too much para a Academia, mas, a narrativa de volta por cima após anos muito ruins tem tudo para ser suficiente para chegar à primeira indicação da carreira. 

E o que dizer do quarteto feminino de “Emilia Pérez”, vencedor de Melhor Atriz? Das quatro, vejo com grandes chances de chegar ao Oscar tanto a Zoe Saldaña, atriz querida em Hollywood, mas, sem uma indicação sequer, e a Karla Sofía Gascón, intérprete trans que fez um discurso emocionante em Cannes e poderia ser uma quebra de tabu histórica para a Academia. 

Dos candidatos internacionais, Portugal pode sonhar com a primeira indicação do país em Filme Internacional com “Grand Tour”. Isso, principalmente, por conta da vitória de Miguel Gomes em Melhor Direção. Sem dúvida, a maior chance em anos. 

Por fim, os dois filmes mais badalados do festival: o iraniano “A Semente da Figueira Sagrada” foi ovacionado no penúltimo dia e muitos protestaram por ele apenas ter levado o prêmio especial. Se a possibilidade de um boicote existe Filme Internacional, por outro lado, a Academia pode muito bem colocá-lo nas demais categorias principais, incluindo, Roteiro Original, atuações, Filme e, principalmente, Direção.  

O Mohammad Rasoulof fugiu do Irã após ser condenado a oito anos de prisão. Não duvido o Oscar querer abraçar a causa da liberdade de expressão com a possível indicação dele. 

Por fim, “Anora” levou os EUA ao topo do Festival de Cannes após 13 anos; a última conquista do país aconteceu com “A Árvore da Vida”. Importante notar que, exceção a “Coração Selvagem”, do David Lynch, e “Fahrenheit 11 de Setembro”, do Michael Moore, todos os demais vencedores norte-americanos da Palma de Ouro foram indicados a Melhor Filme. Na lista estão clássicos como “Marty”, “Apocalypse Now”, “All That Jazz” e “Pulp Fiction”. 

Em uma temporada que se anuncia longe de ser das mais empolgantes, “Anora” me parece ter dado um passo decisivo para figurar entre os 10 finalistas da categoria máxima. O diretor Sean Baker e a atriz Mikey Madison vão precisar remar mais um pouco para garantirem suas posições, mas, inegável que largam muito bem.