De todos os filmes de ação/ficção-científica dos anos 1980 que fizeram sucesso, O Exterminador do Futuro (1984) era, em tese, o que tinha a menor probabilidade de virar franquia. Vigoroso e impactante longa que impulsionou as carreiras do seu roteirista/diretor, James Cameron, e do seu astro, Arnold Schwarzenegger, o filme tinha pegada B, com uma trama bem fechadinha e cujas regras da viagem no tempo pareciam ser definitivas – os personagens até dizem, numa cena, que a máquina do tempo que enviou o exterminador e o soldado humano ao passado, um para matar Sarah Connor e o outro para protegê-la, foi destruída, inviabilizando novas viagens.
Todavia, O Exterminador do Futuro acabou, sim, virando uma máquina de continuações. O Exterminador do Futuro 2: O Julgamento Final (1991), também de Cameron, é mais épico e espetacular, um marco dos efeitos visuais e considerado com justiça uma das melhores continuações de todos os tempos – particularmente, prefiro o original com seu clima de terror e condução implacável. Depois vieram outros, porque Cameron teve de largar mão de sua criação e outros produtores e diretores assumiram até o negócio virar uma salada mista de viagens no tempo e cenas de ação. Há poucos anos, os direitos da marca retornaram para Cameron, que se aliou com Tim Miller, do sucesso Deadpool (2016), para realizar este Destino Sombrio, a retomada da franquia que ignora as sequências anteriores e continua a história a partir do segundo filme.
Outra pessoa que teve a carreira impulsionada por Exterminador do Futuro foi a atriz Linda Hamilton, a intérprete de Sarah Connor, a futura mãe do salvador da humanidade na vindoura guerra contra as máquinas. E Hamilton é a melhor coisa de Destino Sombrio, retomando a personagem que ficou de fora das outras continuações. Sarah volta à ação quando dois novos personagens chegam do futuro para causar destruição no México e nos EUA: um novo exterminador (Gabriel Luna), com a missão de matar a jovem Daniela (Natalia Reyes), e uma humana aprimorada, Grace (Mackenzie Davis), com a missão de protegê-la.
A voz está mais rouca, os cabelos mais brancos, mas é a mesma Sarah. E Linda Hamilton não é o único elemento familiar dos filmes de Cameron a retornar. Destino Sombrio é praticamente um repeteco do segundo filme, com alguns conceitos do primeiro, e homenagens salpicadas por cima. Até as sequências de ação têm como molde as do segundo filme: perseguição numa rodovia; um confronto numa prisão na fronteira substituindo o hospital psiquiátrico; e o final apocalíptico em um grande ambiente industrial só troca o fogo pela água, uma siderúrgica por uma hidrelétrica.
HORA DE DAR ADEUS
A intenção de Cameron, Miller e do pequeno batalhão de roteiristas é clara: depois de tanta bagunça ao longo das décadas, este novo Exterminador do Futuro chega para ser o Jurassic World (2015), o Star Wars: O Despertar da Força (2015) da sua franquia. É um reboot/refilmagem disfarçado de continuação, que se contenta em proporcionar aos fãs uma experiência o mais próxima possível das suas lembranças dos filmes antigos.
Funciona? Bem, até que sim. Destino Sombrio é divertido, desde que o espectador não pare para pensar muito no que está vendo, e é realmente o melhor Exterminador desde o segundo filme. Mas essa opção é também meio preguiçosa e demonstra que a franquia já deu o que tinha para dar no cinema. Quando o único caminho para renovar uma franquia é reciclar seus “melhores momentos”, é de se perguntar se ainda vale a pena continuar fazendo esses filmes, do ponto de vista criativo.
Para ser justo com o filme, aqui e ali há alguns elementos novos: o protagonismo feminino no roteiro é a progressão natural da concepção de Cameron, que fazia de Sarah a verdadeira heroína de Exterminador do Futuro. As três atrizes, Hamilton, Davis e Reyes, atuam com garra e força. Hamilton revisita com óbvio prazer aquele nervo exposto de emoção e poder que é Sarah, e Davis, com seu visual meio alienígena, convence como figura poderosa. Pena que nem mesmo elas consigam superar alguns diálogos ruins e situações estranhas, especialmente no começo da história…
A opção de colocar Schwarzenegger como coadjuvante – ele só aparece no terceiro ato do filme – também é corajosa. Quando ele entra em cena, não decepciona e seu carisma de astro rapidamente o torna a figura mais querida do filme. E de novo, é uma pena que a sua aparição não faça muito sentido dentro da trama e levante perguntas que o roteiro não consegue responder…
Miller dirige sequências de ação com clima meio cartunesco de maneira eficiente, e as atrizes seguram o peso dramático. O filme flui bem até seu desfecho. Mas não consegue deixar de ser só mais um Exterminador: Apesar das promessas de Cameron, do seu envolvimento na produção e na elaboração da história, da nostalgia e da presença dessas mulheres poderosas, falta a Destino Sombrio a força, a “pegada” que os dois primeiros longas possuíam. É um filme sem “poder de fogo”, bem feito, mas, no fim das contas, apenas outro produto hollywoodiano meio calculado demais para agradar ao público.
Parece que, como seus personagens, o criador do Exterminador quis voltar no tempo, para apagar alguns erros do passado. Mas acabou apenas demonstrando a própria futilidade de sua empreitada: Cameron, junto com seus colegas, acabou fazendo só mais uma continuação esquecível do seu próprio filme que não deveria ter tido continuação. Ou melhor, devia ter tido apenas uma.