Vou abrir meu coração, caro leitor: “Stone Heart” me deixa diante de um impasse. De um lado, impossível não ressaltar o que o filme representa um avanço técnico inegável para o ainda incipiente setor da animação no Amazonas, especialmente, do ponto de vista técnico – sem medo de errar, arrisco dizer se tratar da mais bem-acabada obra do gênero já feita no Estado. Por outro lado, tirar deste contexto regional também se faz necessário para analisá-lo como o curta-metragem que é, apontando, infelizmente, suas deficiências visíveis.

Aqui, neste segundo ponto, o curta dirigido e roteirizado por Humberto Rodrigues na parceria entre a produtora amazonas Petit Fabrik e a Druzina Content se torna vítima da inevitável comparação com “Wall-E”. Igual a obra-prima da Pixar vencedora do Oscar 2009, temos um mundo pós-apocalíptico em que sobram escombros e poeira, enquanto a água é escassa. Em “Stone Heart”, o agente de transformação é uma pequena flor brotando de onde não há esperança, a qual tira o nosso protagonista da condição de uma rocha e o torna um homem novamente. Infelizmente, ele não entenderá a riqueza do que tem em mãos e em vez de dividir opta pelo velho egoísmo.

Evidente que a mensagem proposta por Humberto Rodrigues é mais do que válida, urgente e extremamente atual – basta olhar a desigual distribuição da vacinação ao redor do planeta, responsável por ajudar no surgimento de variantes perigosas como a Ômicron em regiões onde a imunização é baixíssima, enquanto os países mais ricos esbanjam até quarta dose. Porém, o desenvolvimento da trama esquece justamente a humanidade para crescer diante do espectador.

Selecionado para o Festival de Gramado 2021 e para a quarta edição do Olhar do Norte, “Stone Heart” desperdiça ricas oportunidades de criar algum laço do público para com o protagonista; ao regar a flor diariamente, por exemplo, temos a noção da passagem de tempo, mas, não o que aquilo significa para o personagem. A opção por situar a sequência através de um plano aberto o afasta não apenas física mais também emocionalmente. A falta de maior expressividade na animação do rosto e, principalmente, do olhar do personagem completa o distanciamento. Essa frieza dilui o impacto do ato egoísta do protagonista, o desfecho trágico e, consequentemente, a importante mensagem moral.

Por outro lado, o curta prende a atenção pelas imagens belíssimas e os efeitos de certas sequências. A transformação do protagonista de rocha para um homem com as pequenas pedrinhas deixando o corpo dele ou os locais infernais que ele passa para chegar ao lago de cor verde são de emoldurar na parede de tão belas. Pena “Stone Heart” não alcançar a mesma excelência no campo emocional e deixar toda a responsabilidade de envolver o público pela mensagem, algo que a Pixar, principalmente em seus curtas, conseguiu tão bem fazer ao longo de décadas.

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