O drama da Lituânia, “The Lawyer”, é um conto comovente de pessoas que chegam a um acordo consigo mesmas. Combinando uma fotografia exuberante e comentários sociais pungentes de pano de fundo, o quarto longa de Romas Zabarauskas apresenta essa história de tristeza e amor em um filme certeiro e potente.

Marius (Eimutis Kvoščiauskas) é um advogado corporativo em Vilnius, capital da Lituânia, enfrentando uma crise de meia idade enquanto contempla o vazio de seu estilo de vida privilegiado. Ele anseia por um companheiro, mas acima de tudo, por algo que possa dar sentido à sua vida. Quando seu pai morre, o processo de luto o leva a encontrar Ali (Doğaç Yildiz), um refugiado sírio na Sérvia que ele conheceu através de sessões de sexcam. O encontro leva esses dois homens muito complicados a tentarem a salvação.

A força do roteiro, também escrito por Zabarauskas, é como ele se aventura além das fronteiras desse enredo enganosamente simples para lidar com muitas questões em torno da vida gay na Europa Oriental. O escritor-diretor segue claramente interessado em discutir a homofobia na região, retratando como a comunidade LGBT deseja explorar como o contato com alguém de outra origem pode ser transformador. No entanto, ele também encontra tempo para comentar sobre o tédio da classe alta e a percepção social dos refugiados.

Essa ousadia aparece no retrato complexo de Ali. O personagem é um bissexual ativo que parece não ser gay o suficiente para atender aos critérios para iniciativas especiais de refugiados LGBT. Contra todas as probabilidades, ele sente falta de sua terra natal e se recusa a ser visto como vítima, a tal ponto que esse mesmo desafio acabou moldando suas interações com as pessoas desde que fugiu da Síria.

Por sua parte, Marius cegou-se à inutilidade de sua vida e há o suficiente na opinião de Kvoščiauskas sobre o personagem para sugerir que, em um canto profundo de sua alma, ele não chegou totalmente a um acordo sobre quem ele é. Ao avaliar a situação em um quarto de hotel em Belgrado, os dois homens percebem que a única maneira de seguir em frente é enfrentar todos os aspectos de seus demônios.

Graças ao trabalho do diretor de fotografia Narvydas Naujalis, tudo parece muito polido, com trabalhos de câmera precisos e cores vivas se fundindo em tomadas maravilhosas (o fato de que os dois protagonistas são fáceis para os olhos também não machuca). Muitas vezes confiando na composição para reforçar os temas do filme, seu trabalho aqui dá aos procedimentos um brilho austero. Como seu personagem-título, “The Lawyer” mantém os espectadores adivinhando a totalidade de seu tempo de execução e os faz pensar sobre esse drama muito depois dos créditos.

‘Rivais’: a partida debochada e sensual de Luca Guadagnino

Luca Guadagnino dá o recado nos primeiros segundos de “Rivais”: cada gota de suor, cada cicatriz, cada olhar e cada feixe de luz carregam bem mais do que aparentam. O que parece uma partida qualquer entre um dos melhores tenistas do mundo e outro que não consegue...

‘A Paixão Segundo G.H’: respeito excessivo a Clarice empalidece filme

Mesmo com a carreira consolidada na televisão – dirigiu séries e novelas - admiro a coragem de Luiz Fernando Carvalho em querer se desafiar como diretor de cinema ao adaptar obras literárias que são consideradas intransponíveis ou impossíveis de serem realizadas para...

‘La Chimera’: a Itália como lugar de impossibilidade e contradição

Alice Rohrwacher tem um cinema muito pontual. A diretora, oriunda do interior da Toscana, costuma nos transportar para esta Itália que parece carregar consigo: bucólica, rural, encantadora e mágica. Fez isso em “As Maravilhas”, “Feliz como Lázaro” e até mesmo nos...

‘Late Night With the Devil’: preso nas engrenagens do found footage

A mais recente adição ao filão do found footage é este "Late Night With the Devil". Claramente inspirado pelo clássico britânico do gênero, "Ghostwatch", o filme dos irmãos Cameron e Colin Cairnes, dupla australiana trabalhando no horror independente desde a última...

‘Rebel Moon – Parte 2’: desastre com assinatura de Zack Snyder

A pior coisa que pode acontecer com qualquer artista – e isso inclui diretores de cinema – é acreditar no próprio hype que criam ao seu redor – isso, claro, na minha opinião. Com o perdão da expressão, quando o artista começa a gostar do cheiro dos próprios peidos, aí...

‘Meu nome era Eileen’: atrizes brilham em filme que não decola

Enquanto assistia “Meu nome era Eileen”, tentava fazer várias conexões sobre o que o filme de William Oldroyd (“Lady Macbeth”) se tratava. Entre enigmas, suspense, desejo e obsessão, a verdade é que o grande trunfo da trama se concentra na dupla formada por Thomasin...

‘Love Lies Bleeding’: estilo A24 sacrifica boas premissas

Algo cheira mal em “Love Lies Bleeding” e é difícil articular o quê. Não é o cheiro das privadas entupidas que Lou (Kristen Stewart) precisa consertar, nem da atmosfera maciça de suor acre que toma conta da academia que gerencia. É, antes, o cheiro de um estúdio (e...

‘Ghostbusters: Apocalipse de Gelo’: apelo a nostalgia produz aventura burocrática

O primeiro “Os Caça-Fantasmas” é até hoje visto como uma referência na cultura pop. Na minha concepção a reputação de fenômeno cultural que marcou gerações (a qual incluo a minha) se dá mais pelos personagens carismáticos compostos por um dos melhores trio de comédia...

‘Guerra Civil’: um filme sem saber o que dizer  

Todos nós gostamos do Wagner Moura (e seu novo bigode); todos nós gostamos de Kirsten Dunst; e todos nós adoraríamos testemunhar a derrocada dos EUA. Por que então “Guerra Civil” é um saco?  A culpa, claro, é do diretor. Agora, é importante esclarecer que Alex Garland...

‘Matador de Aluguel’: Jake Gyllenhaal salva filme do nocaute técnico

Para uma parte da cinefilia, os remakes são considerados o suprassumo do que existe de pior no mundo cinematográfico. Pessoalmente não sou contra e até compreendo que servem para os estúdios reduzirem os riscos financeiros. Por outro lado, eles deixam o capital...