Eu gosto quando o Tom Cruise salta de um penhasco ou se pendura de um avião. Mas, graças a Deus, não sou profissionalmente obrigado a assistir nenhum documentário que mostre o sujeito detestável que ele, sem dúvidas, é na vida real (apesar de já haver vasta documentação quanto a isso). 

Era esse, aliás, o principal problema de um documentário recente, “Free Solo”, que talvez você tenha assistido. Narrando as façanhas de um sujeito que insistia em escalar os mais altos picos sem equipamento de segurança, o filme causou crises de nervos nas plateias pelo mundo e chegou até o Oscar, onde levou a estatueta para casa. 

O que quero dizer é que, com esse tipo de documentário, ao qual “De Tirar o Fôlego” vem fazer parte, o envolvimento emocional do espectador depende de um simples fator: o quão estúpido você considera o esforço dos protagonistas. Felizmente, não é o caso aqui de precisarmos aturar nenhum chatonildo como o sujeito de “Free Solo”, o que ajuda o filme a descer melhor. 

Mergulhando de cabeça

Conhecemos Alessandra Zecchini ainda adolescente, dando as primeiras braçadas no mundo do free diving competitivo – onde é preciso ser obstinado e contar com uma certa dose de arrogância como pré-requisitos. O grande nome desse esporte extremo é a russa Natalia Molchanova, detentora do maior número de recordes mundiais na categoria. Alessandra, é claro, quer ultrapassá-la.

Enquanto isso, no coração do Congo, o jovem Stephen Keenan sonha em conhecer os gorilas. Sua jornada espiritual o leva a percorrer todo o continente africano, até que arma seu acampamento em Dahab, costa do Egito. Lá, “De Tirar o Fôlego” nos informa, fica a Meca dos freedivers, onde Stephen logo forma uma comunidade transcontinental com os melhores e mais atléticos espécimes da raça humana.

Como o destino dessas duas figuras será entrelaçado? Essa pergunta funciona como motor do documentário, que articula diversas entrevistas com aqueles que os cercavam. Ficam faltando apenas dois entrevistados: os próprios Stephen e Alessandra, levantando uma forte suspeita de que algo não vai acabar bem nessa história.

Essa suspeita prende o espectador e adiciona boas doses de tensão a cada uma das sequências de mergulho em profundidade. Trata-se, portanto, de um dispositivo narrativo eficaz, mas ligeiramente perverso em se tratando da história de pessoas reais. Ainda no que tange aos mergulhos, “De Tirar o Fôlego” alterna entre um rico material de arquivo e reconstituições que aparecem em momentos-chave da narrativa – novamente, de forma eficaz.

Pois é visando a eficácia que a diretora Laura Mcgann decidiu estruturar seu documentário como qualquer outro filme de esportes/atividades radicais. Temos aqui o herói/heroína brilhante, porém intrépido/a, que sempre vai um pouco além do que deveria – bem do jeitinho que “Top Gun – Ases Indomáveis” e “Dias de Trovão” funcionam, para nos mantermos na filmografia de nosso santo patrono da Danger Zone.

Ótimo, vocês dizem; já sabemos então que o filme entretém. Mas há alguma lição a ser aprendida aqui (já que a montagem emotiva e a música inspiradora parecem dizer ser o caso)? Ao que só posso responder que, se sim, não é nada muito diferente do que o senso comum já nos diz de antemão: mergulhar sem oxigênio é um troço perigoso pra burro.

Nesse caso, resta o aspecto sensorial de “De Tirar o Fôlego”: a experiência imersiva de mergulhar às profundezas do oceano e tudo o mais. Bom, digamos apenas que, em termos de exploração subaquática, prefiro ficar com o hiper-realismo artificial de “Avatar – O Caminho da Água” do que o documental à la Canal Off daqui.