Diretor de títulos como ‘O Profissional’ e ‘O Quinto Elemento’, Luc Besson chamou atenção para sua carreira como cineasta na década de 1990, se tornando um dos nomes mais promissores da época. Apresentando alguns trabalhos medianos até 2010, suas produções mais recentes ‘Lucy’ e Valerian e a Cidade dos Mil Planetas obtiveram uma recepção negativa de público e crítica. Para completar este hall ‘Anna’ confirma que o diretor francês precisa de uma reinvenção urgentemente.

Demonstrando muitas semelhanças com ‘Nikita’ (outro clássico de Besson), ‘Anna’ apresenta sua personagem-título como alguém que repetitivamente busca sua liberdade, a qual é constantemente negada por diferentes pessoas. Nesta trajetória, Anna (Sasha Luss) se torna modelo ao mesmo tempo em que trabalha para o serviço secreto russo KGB, após ter sido treinada pela organização para realizar execuções.

Para entender a vida da protagonista, “Anna – O Perigo tem Nome” aproveita diferentes linhas temporais de sua trajetória. Esta escolha se torna o grande erro da produção, pois, o público não apenas tem conhecimento de que períodos distintos estão sendo apresentados, como o diretor faz questão de marcar as datas diversas vezes no longa. Esta característica fica ainda pior quando o filme precisa voltar em algum momento já visto para revelar um plot twist plantado desde o princípio.

Além de ser desnecessário explicar a cronologia do longa de forma tão detalhada, também é extremamente cansativo. Esta parece uma escolha preguiçosa de Besson em sair datando cada acontecimento, o que poderia ter sido feito de forma mais sutil por meio da montagem, por exemplo.

Elenco mal aproveitado

Outra péssima escolha de Besson é insistir em colocar um elenco americano para interpretar russos. Luke Evans e Helen Mirren são totalmente desperdiçados na narrativa e ainda precisam forçar o sotaque que, vez ou outra, acaba esquecido por Evans. A veterana Mirren, inclusive, até consegue ser a melhor personagem deste elenco secundário, principalmente, por sua relação com Anna, mas também não consegue escapar de diálogos bregas.

Apesar da falta de carisma, a russa Sasha Luss consegue convencer em seu papel como protagonista, entretanto, a construção da personagem fracassa no aprofundamento. Mesmo sendo claro para o público quem é Anna e qual seu objetivo de vida, ela não consegue se relacionar com o espectador ou fazê-lo criar empatia por sua história. Isto se deve principalmente aos diferentes desempenhos com cada núcleo que interage: além de modelo, a personagem é espiã para a KGB e, posteriormente, passa a trabalhar para o governo americano.

Assim, ao invés de aprofundar nos dramas particulares de Anna, o filme a coloca como uma espiã matadora e sedutora. Sim, além de se envolver profissionalmente com duas corporações inimigas, Anna também tem tempo para se relacionar com o russo Alex Tchenkov (Luke Evans), o americano Lenny Miller (Cillian Murphy) e a modelo francesa Maud (Lera Abova). Todas relações são bem descartáveis para a trama na verdade, servindo apenas para justificar alguns momentos e revelações.

Mas, entre toda trama superficial e cansativa algo chama atenção do público: as cenas de luta. Besson traz toda a pegada de ação para a produção com cenas bem construídas, coreografadas e sem grandes erros de continuidade. São estes momentos que conseguem criar uma tensão maior para o filme e motivar o espectador a não desistir da trama, entretanto, com a diminuição destas cenas no desfecho, o longa volta a soar desinteressante e repetitivo.

Em linhas gerais, ‘Anna – O Perigo tem Nome’ tenta se aproximar de ‘Nikita’, mas herda todos os defeitos de ‘Lucy’: uma história desinteressante recheada de problemas no roteiro. É verdadeiramente uma pena ver que um diretor com tanto potencial como Luc Besson não está conseguindo “se encontrar” à frente de seus últimos projetos. Entretanto, a essência de seu trabalho, mesmo que escondida em poucas cenas de ação, ainda resiste apesar dos anos.

‘A Paixão Segundo G.H’: respeito excessivo a Clarice empalidece filme

Mesmo com a carreira consolidada na televisão – dirigiu séries e novelas - admiro a coragem de Luiz Fernando Carvalho em querer se desafiar como diretor de cinema ao adaptar obras literárias que são consideradas intransponíveis ou impossíveis de serem realizadas para...

‘La Chimera’: a Itália como lugar de impossibilidade e contradição

Alice Rohrwacher tem um cinema muito pontual. A diretora, oriunda do interior da Toscana, costuma nos transportar para esta Itália que parece carregar consigo: bucólica, rural, encantadora e mágica. Fez isso em “As Maravilhas”, “Feliz como Lázaro” e até mesmo nos...

‘Late Night With the Devil’: preso nas engrenagens do found footage

A mais recente adição ao filão do found footage é este "Late Night With the Devil". Claramente inspirado pelo clássico britânico do gênero, "Ghostwatch", o filme dos irmãos Cameron e Colin Cairnes, dupla australiana trabalhando no horror independente desde a última...

‘Rebel Moon – Parte 2’: desastre com assinatura de Zack Snyder

A pior coisa que pode acontecer com qualquer artista – e isso inclui diretores de cinema – é acreditar no próprio hype que criam ao seu redor – isso, claro, na minha opinião. Com o perdão da expressão, quando o artista começa a gostar do cheiro dos próprios peidos, aí...

‘Meu nome era Eileen’: atrizes brilham em filme que não decola

Enquanto assistia “Meu nome era Eileen”, tentava fazer várias conexões sobre o que o filme de William Oldroyd (“Lady Macbeth”) se tratava. Entre enigmas, suspense, desejo e obsessão, a verdade é que o grande trunfo da trama se concentra na dupla formada por Thomasin...

‘Love Lies Bleeding’: estilo A24 sacrifica boas premissas

Algo cheira mal em “Love Lies Bleeding” e é difícil articular o quê. Não é o cheiro das privadas entupidas que Lou (Kristen Stewart) precisa consertar, nem da atmosfera maciça de suor acre que toma conta da academia que gerencia. É, antes, o cheiro de um estúdio (e...

‘Ghostbusters: Apocalipse de Gelo’: apelo a nostalgia produz aventura burocrática

O primeiro “Os Caça-Fantasmas” é até hoje visto como uma referência na cultura pop. Na minha concepção a reputação de fenômeno cultural que marcou gerações (a qual incluo a minha) se dá mais pelos personagens carismáticos compostos por um dos melhores trio de comédia...

‘Guerra Civil’: um filme sem saber o que dizer  

Todos nós gostamos do Wagner Moura (e seu novo bigode); todos nós gostamos de Kirsten Dunst; e todos nós adoraríamos testemunhar a derrocada dos EUA. Por que então “Guerra Civil” é um saco?  A culpa, claro, é do diretor. Agora, é importante esclarecer que Alex Garland...

‘Matador de Aluguel’: Jake Gyllenhaal salva filme do nocaute técnico

Para uma parte da cinefilia, os remakes são considerados o suprassumo do que existe de pior no mundo cinematográfico. Pessoalmente não sou contra e até compreendo que servem para os estúdios reduzirem os riscos financeiros. Por outro lado, eles deixam o capital...

‘Origin’: narrativa forte em contraste com conceitos acadêmicos

“Origin” toca em dois pontos que me tangenciam: pesquisa acadêmica e a questão de raça. Ava Duvernay, que assina direção e o roteiro, é uma cineasta ambiciosa, rigorosa e que não deixa de ser didática em seus projetos. Entendo que ela toma esse caminho porque discutir...