Filme mais recente do experiente Marco Bellocchio, ”O Traidor” é uma versão enérgica das aflições de um informante da máfia na Itália nos anos 1980. Apesar de não contar com a profundidade narrativa dos grandes dramas de máfia, as sessões lotadas no Festival Internacional de Cinema de Karlovy Vary sugerem um potencial de atrair grandes plateias.
A co-produção Brasil-Itália, lançada neste ano no Festival de Cannes, segue três décadas da vida de Tommaso Buscetta (Pierfrancesco Favino), primeiro chefe da máfia siciliana a delatar as atividades da organização criminosa para as autoridades. As informações fornecidas por ele deram origem ao “Maxiprocesso“ – o maior processo judicial da história.
Inicialmente, a história de Buscetta trata-se de um dilema moral: ele é um homem criado em um ambiente que acredita que a máfia é boa, honrada e um modo de vida que implica ordem e apoio. Com a expansão do tráfico de drogas do grupo e a subseqüente contagem de corpos aumentando a cada dia, ele começa a questionar a natureza da associação.
Ao se mudar para o Brasil para comandar operações mafiosas na América do Sul, uma guerra entre facções explode na Itália e a impiedosa polícia da ditadura brasileira o prende. Com a vida de sua esposa ameaçada, ele decide cooperar com o juiz italiano Giovanni Falcone (Fausto Russo Alesi) em um esforço para derrubar a Cosa Nostra.
DRAMA DE TRIBUNAL SUSTENTA FILME
Co-autor do roteiro, Bellocchio imbue “O Traidor” de ação suficiente para preencher seus longos 135 minutos. Apesar disso, o filme não destina muito do seu tempo ao dia-a-dia da máfia, de forma que se torna difícil para o público se importar com o destino dos gangsters quando eles começam a ser presos.
Nesse sentido, o filme empalidece em comparação com clássicos como “Os Bons Companheiros” – talvez a representação definitiva de um informante da máfia no cinema. Apesar de ele ser o protagonista, nem mesmo a personalidade de Tommaso é explorada em profundidade: apenas seu desafio ao sistema que o originou e seu medo de ser morto por ele são consistentemente usados na trama.
Os melhores momentos de “O Traidor” ocorrem quando, por volta dos 70 minutos, o longa se torna um drama de tribunal. A primeira audiência do delator, por exemplo, é um retrato tenso e habilmente editado da loucura levada aos tribunais pelo simples escopo das acusações. Seu confronto com o mafioso Pippo Calò (Fabrizio Ferracane) também mostrou como o julgamento foi marcado por ressentimentos pessoais.
Em última análise, assim como o processo eventualmente parece se arrastar e não conseguir manter o interesse da população italiana na época, “O Traidor” desliza nos últimos 30 minutos e dilui a força de sua mensagem ao longo do caminho. No entanto, a produção é uma boa adição ao cânone dos dramas de máfia e não deve deixar fãs do gênero insatisfeitos.
*O jornalista viajou para o Festival de Karlovy Vary como parte da equipe do GoCritic!, programa de fomento de jovens críticos do site Cineuropa.