Fantasia, melancolia e leve toques de surrealismo são as características que definem o suspense dramático “Lamb”, primeiro longa-metragem co-escrito e dirigido por Vladimir Jóhannsson.
O filme venceu o prêmio máximo do Festival Internacional de Cinema Fantástico da Catalunha (Sitges), o mais importante do mundo nesse gênero e é o escolhido para representar a Islândia na categoria de Melhor Filme Internacional do Oscar 2022. Além disso, também esteve na programação da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.
Apesar de ter sido comercializado pela distribuidora norte-americana A24 como um filme de horror com estruturas narrativas e elementos semelhantes aos seus demais filmes do gênero (“A Bruxa” e “O Farol”, ambos de Robert Eggers), só é possível apreciar a obra de Jóhannsson quando a expectativa de assistir um grande thriller é deixada de lado.
Na trama, acompanhamos um casal de fazendeiros María (Noomi Rapace) e Ingvar (Hilmir Snær Guðnason) que vive em uma região isolada na Islândia, onde se dedicam à criação de cordeiros. Certo dia, os dois se deparam com o nascimento de um filhote com características peculiares e, a partir de então, decidem criá-la como filha.
Narrativa dramática com toques de surrealismo
“Lamb” é dividido em três capítulos (que podemos identificar também como os três atos da trama): o primeiro é dedicado, quase que totalmente, a apresentar o ambiente frio e cálido da região, o casal de personagens monótonos e como estes estão inseridos dentro de uma aura melancólica e “sem vida”.
As cenas possuem pouquíssimos diálogos. Entretanto, a direção de fotografia de Eli Arenson se preocupa em trazer sequências com grandes planos abertos da região vazia, porém bela e envolvente. E isso eleva ainda mais a carga dramática e melancólica que “Lamb” possui.
Após a adoção do bebê bizarro pelo casal, percebemos uma mudança de tom no segundo ato. Jóhannsson se preocupa em causar estranhamento no espectador com uso de elementos surrealistas de forma leve e sutil. A experiência, na verdade, se torna mais satisfatória quando o espectador ignora qualquer senso de realidade que possa procurar no desenrolar do enredo.
Boa representação do luto
O estranhamento causado ao longo do filme, porém, não é suficiente para ignorar certas escolhas do diretor em não ir a fundo no desenvolvimento dessa tensão, tendo em vista o caráter de suspense que a produção tenta carregar.
Muitas das cenas em que há troca de conversa entre os personagens acabam se tornando desnecessárias – o que é estranho, tendo em vista que o filme é marcado por poucos diálogos. Além disso, “Lamb” possui em sua estrutura narrativa pontos em que aborda relacionamento, falta de confiança e, principalmente, o processo de luto.
Este último, inclusive, é muito bem construído no roteiro, pois, desde a apresentação dos personagens nos primeiros minutos do filme até a chegada do clímax, é perceptível como a perda de algo ou alguém pode ser bastante traumático.
Desfecho – quase – catártico de um potencial diretor
Ainda que “Lamb” seja desenvolvida por um ritmo lento, a narrativa consegue ter um grau de imprevisibilidade permanente, levando o espectador a sentir que algo pode acontecer a qualquer momento. Como filme de horror, “Lamb” consegue ser um bom suspense dramático. Apesar das decisões de roteiro que influenciam diretamente no desfecho quase catártico, Jòhannsson demonstra saber desenvolver, em seu primeiro trabalho, uma história simples com complexidades surrealistas.
Há quem possa não gostar de “Lamb”, mas cabe ao espectador ficar atento ao potencial do diretor em seus próximos filmes.