De “Retratos Fantasmas” a “The Zone of Interest”, Caio Pimenta analisa as possibilidades do Oscar 2024 de Melhor Filme Internacional.

CORRENDO POR FORA

Candidato da Polônia, “The Peasants” utiliza mesma técnica de “Com Amor, Vincent”.

Nomeada ao Oscar apenas uma vez na história, a Romênia deve continuar na seca. O país apostou em “Não Espere Muito do Fim do Mundo”. A produção é o novo longa do Radu Jude, vencedor há dois anos do Urso de Ouro em Berlim por “Má Sorte no Sexo ou Pornô Acidental”. Apesar de ter conquistado o prêmio do júri em Locarno, o longa sobre um assistente de produção gravando um vídeo de segurança tende a ficar em segundo plano para outros candidatos europeus mais pesados. 

O polonês “The Peasants” é outro candidato correndo por fora pela disputa de Filme Internacional. A equipe do sucesso “Com Amor, Vincent”, desta vez, utiliza a mesma técnica para adaptar o romance ganhador do Prêmio Nobel sobre uma camponesa polonesa do início do século XX que causa estragos ao se casar com um homem rico e mais velho. Até hoje, somente “Valsa com Bashir” e “Flee” foram as animações que chegaram à categoria, o que torna a missão bem espinhosa. 

“20 Days in Mariupol” tenta levar Ucrânia ao Oscar 2024.

A Ucrânia aposta em “20 Days in Mariupol” na busca para novamente chamar a atenção da Academia em relação ao conflito no país. O documentário mostra a luta de jornalistas na cidade para seguir mostrando os horrores da guerra enquanto as tropas russas cercam a região. Para além de ser raro filmes do gênero na categoria, o combate na Europa passa por um momento de cansaço da opinião pública, especialmente, agora, com a crise no Oriente Médio. 

Se em 2023 a guerra na Ucrânia já não recebeu tanta atenção no Oscar, acho improvável acontecer neste ano. 

O senegalês “Banel & Adama” passou pelo Festival de Cannes sem deixar grandes memórias para a crítica e público. Talvez tenha alguma chance de shortlist, porém, ir além disso soa improvável. Sobre a América do Sul, adoraria dizer que nossos candidatos estão fortes, mas, infelizmente, não é o caso. 

Sem Ricardo Darín, Argentina tenta chegar ao Oscar 2024 com “Os Delinquentes”.

O México está representado por “Totém”, produção da Lila Avilés que estreou em Berlim e circulou ao redor do planeta. O drama mostra uma festa surpresa para o pai de uma garota de 7 anos, mas, que acaba por desestruturar toda a família.

Com estreia prevista para outubro deste ano, “Os Delinquentes” representa o tradicional cinema argentino. Sem Ricardo Darín, protagonista dos quatro últimos indicados do país, o filme mostra dois bancários cansados da rotina, que resolvem cometer um crime para ter uma vida melhor no futuro. A boa recepção junto à crítica estrangeira pode ajudar a impulsionar o longa e, quem sabe, ser uma surpresa na lista final. 

O chileno “Los Colonos” completa o time correndo por fora. Credenciado com o prêmio da crítica da mostra Um Certo Olhar do Festival de Cannes, o longa mostra o cerco de um ex-capitão inglês e um mercenário norte-americano ao proprietário de terras de origem espanhola. Pode jogar a favor do filme esta internacionalização somada a explorar o western na América do Sul. Hoje, entretanto, soa improvável uma indicação. 

CHANCES MÉDIAS

Mads Mikkelsen estrela “The Promised Land” tentando repetir o feito de “Druk”.

O time de chances médias traz muitos grandes países europeus. 

“The Promised Land” chega com a força do Mads Mikkelsen, astro reconhecido em Hollywood. A produção sobre o responsável por estabelecer uma colônia onde hoje é o território da Dinamarca foi lançada em Veneza já mirando o Oscar. Saiu sem grande adoração da crítica, mas, pode recuperar o terreno perdido. Para isso, se apoia justamente no protagonista, o qual esteve em dois dos indicados ao Oscar do país nos últimos anos. 

J.A Bayona comanda “A Sociedade da Neve”, candidato da Espanha ao Oscar.

O espanhol “A Sociedade da Neve” tem credenciais de sobra para não passar desapercebido: apoio da Netflix, o diretor J.A Bayona, que já comandou em Hollywood sucessos como “O Impossível” e “Jurassic World”, e a história conhecida do acidente aéreo nos Andes. Com potencial de fazer uma campanha forte, as chances de ser indicado não são poucas. 

Finlandês “Fallen Leaves” chega credenciado após ótimo Festival de Cannes.

Justamente a falta de investimento pesado para campanha coloca em risco “Fallen Leaves”. A comédia romântica finlandesa conquistou o Prêmio do Júri em Cannes e saiu aclamado pela crítica. Ser uma produção mais leve em meio a tantos filmes mais pesados pode se mostrar um ponto a favor do Aki Kaurismäki na briga pela vaga. 

Nuri Bilge Ceylan comanda o drama turco “About Dry Glasses”

Nunca indicada ao Oscar, a Turquia tenta quebrar este hiato com “About Dry Glasses”. Por mais prestigiado que seja no circuito europeu e junto à crítica, o Nuri Bilge Ceylan parece muito longe do estilo da Academia – os dramas extremamente longos e cadenciados podem até funcionar para um júri de festival, mas, para colegiados, acho muito complicado. 

“Io Capitano” venceu três prêmios no último Festival de Veneza.

Já o italiano “Io Capitano” fez bonito em Veneza ao ganhar três prêmios, incluindo, Melhor Direção com Matteo Garrone. A aventura sobre dois jovens africanos cruzando mar e deserto para chegarem à Europa fala de um tema sempre em voga e superou a pesada concorrência interna de “La Chimera”. Somada à tradição do país, tem potencial para sonhar com a nomeação. 

Completam o time dos candidatos com chances médias o australiano “Shayda” e “The Monk and the Gun”, do Butão. Para este último, a expectativa é repetir a história de “Lunana”, em 2022, uma das mais improváveis indicações ao Oscar da categoria dos últimos anos. 

CHANCES GRANDES 

Alemanha quer segundo Oscar consecutivo da categoria com “The Teacher´s Lounge”.

Hora da turma com grandes chances de indicações a Melhor Filme Internacional. O trio reúne países com muita história na categoria. 

Atual vencedor do prêmio, a Alemanha busca o bicampeonato com “The Teacher´s Lounge”. O drama mostra uma professora idealista investigando o caso de um aluno acusado de roubo. No principal evento do país, aliás, a produção superou “Nada de Novo no Front”, o que já coloca um holofote chamativo para ele. 

Wim Wenders será o primeiro diretor estrangeiro a representar o Japão no Oscar com “Perfect Days”.

Quatro vezes ganhador de Filme Internacional, o Japão aposta em “Perfect Days”. O longa conta com o prestígio do Wim Wenders, primeiro diretor que não é do país a representá-lo na corrida, e ainda ganhou Melhor Ator em Cannes. Ter o apoio da Neon nos EUA para a distribuição dificilmente fará o filme ficar fora da categoria. 

“O Sabor da Vida” chega com a força da tradição do cinema francês.

“O Sabor da Vida” completa o trio de candidatos com grandes chances de indicações. Só de ter batido “Anatomia de uma Queda”, o ganhador da Palma de Ouro, já credencia o candidato francês. Como se não bastasse, saiu premiado em Cannes com Melhor Direção e ainda traz a Juliette Binoche, estrela francesa querida no cinema mundial.  

E o Trần Anh Hùng é especialista em indicações inusitadas: em 1993, “O Cheiro da Papaia Verde” foi nomeado na categoria. O filme foi a única produção solo do Vietnã no Oscar de Filme de Língua Não-Inglesa até hoje. 

O FAVORITO

Drama de Jonathan Glazer é amplo favorito em Filme Internacional.

Tudo isso que falei até agora são de candidatos brigando pela indicação ao Oscar, afinal, o prêmio de Filme Internacional já tem dono. Somente uma tragédia tira a categoria de “The Zone of Interest”, do Jonathan Glazer. 

Como já disse desde o Festival de Cannes, o drama ambientado em uma casa habitada por uma família nazista próxima ao campo de concentração de Auschwitz conta com um prestígio enorme na indústria, o que cresceu após conquistar o Grande Prêmio do Júri e o prêmio da crítica na França.  

Para quem estranha uma produção do Reino Unido aqui, vale dizer que “The Zone of Interest” é falado em alemão e polonês, por isso, pode concorrer normalmente em Filme Internacional. O favoritismo na categoria é mais do que natural, afinal, não faz sentido considerá-lo para as principais disputas, incluindo, Melhor Filme, Direção e Roteiro Adaptado, sempre bem-posicionado e não dar este status a ele aqui. 

E não duvide se a crise no Oriente Médio, ainda fresca na cabeça dos votantes, fortalecer ainda mais a produção da A24. 

E O BRASIL?

“Retratos Fantasmas” chega correndo por fora e com risco de ficar ausente até mesma na shortlist.

E “Retratos Fantasmas”?  

Tenho boas e más notícias. 

A carreira internacional do documentário do Kleber Mendonça Filho foi anunciado no AFI Fest, evento do American Film Institute. A participação do filme se soma aos festivais de Cannes, Chicago e Nova York. Estar neste circuito ajuda a criar um boca a boca positivo e visibilidade positiva. Fora que ter uma distribuidora nos EUA é muito importante. 

Por outro lado, “Retratos Fantasmas”, além de precisar superar todos estes rivais, hoje mais bem posicionados, ainda terá que lidar com a dificuldade de documentários na categoria: até hoje, somente “Honeyland”, “Collective” e “Flee” conseguiram isso. Se formos olhar pelo lado positivo, tudo isso ocorreu nos últimos anos. 

Do atual jeito, o candidato brasileiro corre bem fora e pode estar ausente até da shortlist. Vamos torcer para que eu esteja errado. 

SE AS INDICAÇÕES FOSSEM OS HOJE, OS FINALISTAS SERIAM…

  • “The Zone of Interest”, do Reino Unido 
  • “O Sabor da Vida”, da França 
  • “Perfect Days”, do Japão 
  • “The Teacher´s Lounge”, da Alemanha 
  • “Fallen Leaves”, da Finlândia 

A surpresa pode ser o espanhol “A Sociedade da Neve”.