As listas de melhores de 2021 do Cine Set chega ao fim com o melhor do cinema amazonense.

Como havia dito na retrospectiva, cheguei a fazer a lista de 2020 para ser publicada em janeiro do ano passado, porém, acabei optando por não divulgá-la em meio à tragédia ocorrida no Estado em decorrência da pandemia da Covid-19 a partir da política de imunidade de rebanho defendida por Bolsonaro e abraçada pelo governo local e a maioria da sociedade amazonense.

Só para matar a curiosidade, “Manaus Hot City” levou Melhor Filme, Direção, Ator com Frank Kitzinger e Direção de Fotografia com Rafael Ramos, enquanto “O Barco e o Rio” ficou com Atriz com Isabela Catão e Direção de Arte com Francisco Ricardo, “No Dia Seguinte Ninguém Morreu” ganhou Roteiro, além de ter uma menção honrosa para “Atordoado, Eu Permaneço Atento“.

Pronto, agora, que estou oficialmente livre da lista de 2020, vamos para os melhores de 2021.

Somente foram considerados aptos filmes de diretores nascidos no Amazonas ou que residam no Estado ou que tiveram grande parte de equipe local de produção e que participaram de algum festival local, nacional ou internacional ao longo do ano passado ou com sessões de lançamento entre 1o de janeiro a 31 de dezembro de 2021.

MELHOR FILME – “TERRA NOVA”

Do horror da pandemia que Manaus conhece tão bem, “Terra Nova” registra um lado menos visível: o desamparo de pessoas jogadas à própria sorte graças a um Estado que vira as costas para seus próprios cidadãos. As ruas e avenidas da zona Norte da capital desertas espelham a solidão das duas irmãs vividas por Karol Medeiros e Isabela Catão. O grito após um dia infernal é o mesmo preso em cada um de nós diante de tamanho abandono e descaso. O melhor filme disparado de Diego Bauer e o melhor do cinema amazonense em 2021 com “Graves e Agudos em Construção” bem ali na cola.

MELHOR DIREÇÃO – LUCAS MARTINS, DE “À BEIRA DO GATILHO”

Foto: Divulgação/Lucas Martins

Transpor a atmosfera do cinema policial oitentista norte-americano para as ruas da zona centro-sul de Manaus. Parece loucura, um devaneio? Somente para quem não conhece o talento de Lucas Martins. Cinéfilo inveterado, o jovem diretor traz como maior mérito adaptar as referências do cinemão de Hollywood para a realidade local de produção, executando-as com precisão. A sequência dentro do carro circulando o Vieiralves e o desfecho de “À Beira do Gatilho” são provas de como Lucas é uma joia se lapidando a olhos vistos.

MELHOR ATOR – TACIANO SOARES, DE “A BELA É POC”

Aqui não teve nem graça: Taciano Soares sobrou na categoria com seu desempenho em “A Bela é Poc. Interpretando Belinho, ele domina a cena e os olhos do público naturalmente. A forma como consegue ir do humor ao drama e misturar tudo isso só demonstra o erro dos realizadores locais em não o ter dado mais papéis em filmes recentes do cinema amazonense. A sequência final consagradora coroa uma atuação grandiosa. 

Melhor Atriz: Jôce Mendes, por “O Buraco” 

A categoria de Melhor Atriz foi no VAR: que ano de atuações femininas! Julia Kahane e Karol Medeiros estrearam com tudo no audiovisual local, respectivamente, em “Graves e Agudos em Construção” e “Terra Nova”, Isabela Catão, para variar, arrasa em “Enterrado no Quintal”, enquanto Rosa Malagueta eleva “A Benzedeira”. Minha escolhida, entretanto, é Jôce Mendes pelo desafio físico e psicológico desgastante de trazer ao público a dura e, infelizmente, cotidiana realidade da violência doméstica em “O Buraco”. 

Melhor Roteiro: WALTER FERNANDES JR, DE “Graves e Agudos em Construção” 

Dentro da proposta surrealista de “Graves e Agudos em Construção”, Walter Fernandes Jr constrói uma obra repleta de provocações ao status-quo de ordem e progresso com uma rebeldia das mais bem-vindas para tempos tão sem sentidos como o atual. A lógica interna da trama desencadeia este estado explosivo potencializado na trilha sonora e na performance dos atores. 

Melhor Direção de Fotografia: Robert Coelho, por “O Buraco” 

Foto: Divulgação/Zeudi Souza.

Grande parte do universo sufocante de “O Buraco” se dá graças à forma como Robert Coelho capta aquele triste realidade. A proximidade com que os personagens são enquadrados nos insere de forma instântanea naquele mundo como se fôssemos integrantes daquele processo, aprisionados igual a mãe e ao filho. Já nas sequências de briga, a incompletudide trazida pelo campo de visão obstruído do menino amplifica o extracampo e leva o espectador a completar o horror.

Melhor Figurino: “A Bela é Poc”

Como mostra a imagem acima da camisa cor de rosa de Belinho com dizeres em letras garrafais “DIEU LOVES POC”, o figurino de “A Bela é Poc” não é nada sutil e, aqui, isso passa bem longe de ser um problema. Afinal, casa com a proposta do curta de Eric Lima sendo um atrativo visual muito bem explorado, tanto na entrada triunfal de Isabela Catão em cena com seu conjunto com cores do arco-íris como da bela roupa em vermelho utilizada pelo protagonista na sequência final. 

Melhor Montagem e Som: EDUARDO RESING E LUCAS COELHO, DE “Enterrado no Quintal”

Parceiro de trabalho de Diego Bauer desde a montagem de “Obeso Mórbido“, Eduardo Resing faz mais um grande trabalho ao trazer dinamismo à crueza das imagens e dar ritmo à jornada de vingança da personagem da Isabela Catão. Já o trabalho de som feito por Lucas Coelho complementa a atmosfera violenta, corrida e caótica do bairro Lírio do Vale, fundamentais nesta ambientação de “Enterrado no Quintal”.

Melhor Trilha Sonora: PABLO ARAÚJO, DE “Terra Nova” 

Não irei aqui me meter a ser um crítico musical e analisar acordes ou notas (deixo para o meu parceiro de Cine Set, Renildo Rodrigues tal missão), mas, a trilha composta por Pablo Araújo para “Terra Nova” transmite precisamente ao espectador a sensação de desamparo não apenas presente nas ruas da cidade como também na mente de todos nós.

Melhor Maquiagem: LUA TIOMI, DE “Jamary” 

Responsável pela concepção e criação da maquiagem do figurino de Anhangá, Lua Tiomi conseguiu realçar o tom fantástico do mito amazônico sem exagerar na medida, criando uma figura capaz de transitar e ser crível para o tom mais realista e a mensagem ambiental urgente adotada por Begê Muniz. Sem dúvida, o ponto alto de “Jamary”.

Melhor Direção de Arte: LUCAS MARTINS E MAX MICHEL, DE “À Beira do Gatilho” 

O rigor estético para emular o cinema policial norte-americano dos anos 1980 se faz presente com força na direção de arte de “À Beira do Gatilho”. Do carro vintage ao local da jogatina, Lucas Martins e Max Michel demonstram o extremo cuidado e meticulosidade para construir este universo, elemento fundalmental para o público comprar a proposta do curta.

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