O primeiro grande momento do cinema no Amazonas aconteceu com Silvino Santos entre os anos 1910 a 1930, enquanto a segunda fase ocorreu nos anos 1960 com a geração cineclubista de Cosme Alves Netto, Joaquim Marinho, José Gaspar, entre outros. Desde 2001, com a implantação da Amazonas Film Comission, o audiovisual do Estado vive um novo momento com o surgimento de festivais e eventos do setor e uma nova geração de realizadores.
Sérgio Andrade é um dos expoentes mais célebres desta geração. No Amazonas Film Festival, saiu premiado pelos três primeiros curtas-metragens – “Criminosos”, “Um Rio Entre Nós” e “Cachoeira”. Este último, aliás, venceu dois prêmios no Festival de Brasília 2010: Melhor Direção de Fotografia com Yuri César, e Melhor Trilha Sonora com Puriki e índigenas do alto Rio Negro.
O salto maior veio em 2011 ao vencer o Edital de Baixo Orçamento para Longas-Metragens do extinto Ministério da Cultura, algo até então inédito para o cinema amazonense. O resultado foi “A Floresta de Jonathas”, filme que colocou Sérgio Andrade no radar nacional e internacional. Em 2016, o diretor lançou “Antes o Tempo não Acabava” dentro da Mostra Panorama do Festival de Berlim, um dos maiores eventos de cinema do mundo. Por fim, em 2018, exibiu “A Terra Negra dos Kawá” na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo e no Festival do Rio.
MARCO DE UMA TRAJETÓRIA
Com verdadeiros marcos fundamentais da história recente do cinema amazonense, Sérgio Andrade pretende registrar este caminho no livro “A Floresta Antes da Terra”. A obra irá trazer os roteiros dos três longas da filmografia do diretor junto com desenhos dele e um texto escrito pelo pesquisador Gustavo Soranz. A edição do livro fica por conta de Rômulo Nascimento (“Cine AM: O Audiovisual em Reportagens e Entrevistas”, de Sávio Stoco).
O projeto de “A Floresta Antes da Terra” foi contemplado no Prêmio Conexões Culturais 2020 da Prefeitura de Manaus – Lei Aldir Blanc em Literatura e, para cumprir o curto prazo do edital previsto para 31 de dezembro deste ano, Sérgio irá entregar à Manauscult o material original revisado e o projeto gráfico. Já o lançamento do livro deve acontecer em 2021.
“Acredito que será um material maravilhoso para quem deseja estudar cinema e também conhecer as histórias amazônicas. É um livro com capacidade de dialogar tanto com a Academia quanto com o leitor interessado em boas histórias”, declarou Sérgio ao Cine Set.
LEIA UM TRECHO DO TEXTO DE GUSTAVO SORANZ PARA O LIVRO
A Floresta de Jonathas opera uma inversão em relação ao ponto de vista da narrativa quando o comparamos com os filmes estrangeiros cujas histórias se passam na Amazônia. Aqui estamos acompanhando uma história que surge do interior da floresta. Ao invés de uma imagem de sobrevoo pela imensidão do verde entrecortado pelos rios sinuosos, imagem recorrente sobre a região, temos os conflitos dos moradores que vivem sob esse “tapete verde”. A imagem de abertura do filme mostra o close-up de um homem olhando detidamente para a câmera. Ele está em uma área de mata e é filmado com uma lente teleobjetiva, que o coloca em foco e torna todo o entorno um borrão verde. A banda sonora é preenchida por sons de insetos e pássaros de modo muito intenso, até que diminuem e ouvimos o som de um avião pousando. Este plano parece emblemático da proposta do filme, como a revelar essa inversão proposta no ponto de vista da narrativa. Revelar esse ponto de vista interno da floresta, dar visibilidade ao caboclo, filmado por um amazonense ciente dessa condição de foco narrativo que se altera nessa inversão. Aqui o caboclo devolve o olhar e encara o público como sujeito de sua narrativa
PROJETO ‘CERCANIAS’
“A Floresta Antes da Terra”, entretanto, não é o único projeto de Sérgio Andrade para este fim de ano. O diretor aprovou “Cercanias” na categoria audiovisual, também no Prêmio Conexões Culturais 2020. “Trata-se do desenvolvimento de um roteiro de média-metragem sobre uma cantora indo morar na periferia de Manaus junto com o filho pequeno”, adiantou o cineasta.
Dentro do projeto “Cercanias”, Sérgio prepara ainda um curta intimista e experimental: “Cercanias Gatos”. Definido pelo diretor como um documentário afetivo, o projeto se passa em um espaço comunitário de um condomínio situado na zona Centro-Sul de Manaus em que três gatos de rua surgem na vida de um grupo de moradores, fazendo parte de seu cotidiano e dividindo opiniões. Afinal, a presença deles incomoda ou traz conforto? “Através dos gatos, começamos a ver as relações humanas em uma comunidade de classe média. Propus não o filme pronto, mas, uma compilação de planos como entrega. Não seria possível finalizar um filme completo até 31 de dezembro”, disse Sérgio.
Para o projeto, ele conta com um timaço do audiovisual amazonense, incluindo, Valentina Ricardo (“O Barco e o Rio”) na direção de fotografia e a dupla de “Atordoado, Eu Permaneço Atento”, Henrique Amud (produção executiva e trilha sonora; este último ao lado do próprio Sérgio e Roberto Russo) e Lucas H. Rossi (montagem). Wallid e Nabil Abuchahin, Melka Guimarães e Thiago Alencar integram o elenco, enquanto o trio felino é formado por Mildred, Andrei e Billy. Matheus Cordeiro completa o time como o assistente do curta.