Quando estou numa roda de amigos, por exemplo, e alguém me pergunta o que eu acho sobre os filmes do Stanley Kubrick, logo me vem à mente os seus clássicos: Laranja Mecânica (1971), O Iluminado (1980), 2001: Uma Odisséia no Espaço (1968), mas foram só esses mesmo que ele realizou? Ele não fez outros?
A título de exercício trago aqui outro adorável diretor que também é tema de conversa entre amantes de cinema, Pedro Almodóvar. Dele nos lembramos de Tudo Sobre Minha Mãe (1999), Mulheres a Beira de um Ataque de Nervos (1988), e os demais? Recentemente fiz o seguinte exercício de análise: selecionei os diretores que eu mais gostava e ‘maratonei’ suas filmografias, entre eles, além dos já citados, Céline Sciamma, Anna Muylaert, Spike Lee, Glauber Rocha e Jordan Peele.
O resultado foi surpreendente: acho incrível observar, dentro de uma ordem cronológica, como cada diretor reflete determinados assuntos e faz determinadas escolhas que são, muitas vezes, a síntese de seu trabalho por inteiro. E como, com o passar dos anos, aprimoram, cada vez mais, a forma de esculpir os elementos que compõem suas obras.
No caso de Spike Lee, por exemplo, em seu longa de estreia Ela Quer Tudo (1986) ele já aborda a temática do empoderamento feminino através de sua personagem central, Nola, que hoje, inclusive tem até série na Netflix. Em seus filmes seguintes as questões raciais, os conflitos sociais, econômicos e religiosos que confrontam, muitas vezes, uma sociedade violenta, desigual e injusta são abordagens que se fazem presentes e que propõe ao espectador reflexões acerca de temas fundamentais e cada vez mais pungentes. Em sua última realização, Destacamento Blood (2019), é possível ver esses mesmos signos que percorrem seus roteiros desde Lute Pela Coisa Certa (1988), Faça a Coisa Certa (1989), Mais e Melhores Blues (1990) e por aí vai.
MAIS DICAS
O mesmo posso dizer da diretora francesa Céline Sciamma. Do seu belo Lírios D’água (2007) até o maravilhoso Retrato de Uma Jovem Em Chamas (2019) a realizadora nos presenteia com temáticas que perpassam o universo feminino de maneira avassaladora. As descobertas do corpo, a transição da difícil fase de todos nós infância/adolescência, o amor, o sexo, sempre de modo absolutamente delicado e com uma sensíbilidade e requinte ímpares. Do seu primeiro filme até o último percebemos sua mão em cada cena, como se ela confeccionasse da maneira mais artesanal e cuidadosa possível, ou seja, ela demonstra, com isso, imensa responsabilidade e seriedade pois lida com temas sensíveis a nossa sociedade como o preconceito, homofobia e desigualdade.
Existem também aqueles diretores como Stanley Kubrick que, por mais que ele percorra determinados temas e assuntos, sempre dão aquele jeitinho de surpreender. Seu longa de estreia que o diga. Acredito piamente que se pedissem para um desavisado dizer quem é o diretor de Medo e Desejo (1953) e De Olhos Bem Fechados (1999) ele não diria se tratar do mesmo criativo, inventivo, surpreendente, Kubrick.
Por isso aproveito, aqui neste espaço, para indicar bons filmes não tão badalados de diretores aclamados: assistam Pepi, Luci, Bom e Outras Garotas de Montão (1980) e Labirinto de Paixões (1982) ambos de Pedro Almodóvar, A Origem dos Bebês Segundo Kiki Cavalcanti (1995) e É Proibido Fumar (2009), de Anna Muylaert e Tomboy (2011) de Céline Sciamma. Desfrutem e vejam como esses inícios de carreira impulsionaram grandes e geniais realizadores.