Um filme que reflete perfeitamente os tempos pandêmicos, “Social Hygiene”, de Denis Côté, é uma produção que dá um significado completamente novo ao termo “distanciamento social”. O longa tornou seu realizador um dos ganhadores do prêmio de Melhor Diretor da Encontros, mostra do Festival de Berlim, onde estreou este ano.
O filme segue Antonin (Maxim Gaudette, de “Polytechnique”), um ladrão barato confrontado por cinco mulheres: sua irmã Solveig (Larissa Corriveau), sua mulher Eglantine (Évelyne Rompré), sua amante Cassiopée (Ève Duranceau), a inspetora tributária Rose (Kathleen Fortin) e uma de suas vítimas, Aurore (Éléonore Loiselle).
Antonin é o clássico ‘crianção’: refutando qualquer responsabilidade por seus atos, ele culpa as pessoas e o mundo ao seu redor por suas escolhas e revezes. Logo na primeira cena, ele reclama da “decadência moral” contemporânea, mas confessa que realiza furtos (e até se sente orgulhoso disso) logo depois. As mulheres que o confrontam querem coisas distintas, mas coletivamente elas o provocam a crescer emocionalmente.
O roteiro de Côté é claro em estabelecer um claro abismo entre o protagonista e essas mulheres. Porém, a ideia genial de representar esse abismo colocando seus atores no meio de paisagens campestres, separados por vários metros, gritando suas linhas uns para os outros, é um truque de mestre.
O fato de que um artifício como esse funcione e não pareça apenas algo barato feito para dar um ar “Covid-19” ao filme reflete a afirmação feita pelo diretor à revista Variety de que “Social Hygiene” já foi imaginado em sua presente forma quando foi escrito em 2016, muito antes da pandemia alterar o modo de vida do planeta.
UMA SOCIEDADE NADA MADURA
De fato, a estética chocante do filme vai muito além dessa mise-en-scene: desde as longas tomadas até os anacronismos cada vez mais intrusivos, todo elemento em cena chama a atenção para si mesmo e adiciona camadas de significado à ação. Quando Antonin, em roupas de época, menciona uma publicação no Facebook, por exemplo, o efeito é acachapante.
Gaudette está excelente como o protagonista, sendo magneticamente desprezível nos extensos diálogos que expõem a sua tacanhice. A maioria deles leva em média 10 minutos, sem cortes, com a câmera estaticamente posta à distância. É um triunfo dos realizadores que um filme tão focado em distanciamento chame seus espectadores bem para perto e prenda a atenção.
Há grandes chances de você conhecer um Antonin – aquele cara que culpa o guarda pela multa, o chefe pela demissão por justa causa, a namorada pelo fim do relacionamento abusivo, entre outros. Ele é um reflexo de uma sociedade (e especialmente, de uma masculinidade) que precisa amadurecer – e logo. Em “Social Hygiene”, o público tem a chance de vê-lo e analisá-lo do conforto da melhor posição possível: à distância.