Caio Pimenta analisa os indicados ao Oscar 2024 de Melhor Filme e aponta o nível dela em comparação aos outros anos.

UMA TEMPORADA MARCANTE

Para mim, a lista de 2024 está muito bem servida com a maioria dos filmes de ótimo para cima. 

“Maestro” é a única exceção dos indicados de Melhor Filme. Não que seja um ruim no nível de “Seabiscuit”, “Um Sonho Possível” ou até mesmo “Vice”, mas, a cinebiografia do Leonard Bernstein não consegue engatar em nenhum momento. Apesar dos méritos técnicos, especialmente, maquiagem e penteado, figurinos e direção de fotografia assim como da Carey Mulligan, os excessos e a inconsistência de por qual caminho seguir acabam deixando a produção da Netflix pelo caminho. 

“Ficção Americana” é um bom filme ainda que nada brilhante. Dividido entre a sátira contra os estereótipos dos negros na cultura americana e o drama familiar do protagonista até como contraponto ao primeiro fator, a comédia do Cord Jefferson não atinge o máximo que pode em ambas. Sorte ter um elenco tão talentoso liderado pelo Jeffrey Wright e pontos altos que fazem o filme valer demais. 

A turma acima da média abre com “Pobres Criaturas”: mais um grande filme do Yorgos Lanthimos com toda a estranheza peculiar do cinema dele utilizada para uma versão Frankenstein feminista e satirizando os homens. Para além do trio de protagonistas com direito a uma atuação soberba da Emma Stone, o que foi a direção de arte e figurinos do filme? Sem dúvida, uma das produções mais bonitas que já passaram pelo Oscar nos últimos anos. 

No mesmo patamar está “Os Rejeitados”. Novamente, o Alexander Payne se prova um excelente contador de histórias, remetendo ao cinema dos anos 1970 em uma homenagem especial ao Hal Ashby. Melancolia e recomeço andam de mãos dadas com um trio sensacional de protagonistas. Daqueles filmes que muitos julgam como simples, mas, que olhando com atenção, são bem complexos. 

O time fica completo com “Zona de Interesse”: o Jonathan Glazer traz um novo olhar para uma das maiores tragédias da humanidade. A cumplicidade e naturalidade do ser humano com o horror fazem paralelos incômodos com os dias atuais. Destaco, acima de tudo, a trilha sonora da Mica Levi e o som que leva o extracampo para outro nível. 

Subindo mais um degrau, “Vidas Passadas” abre os filmes que considero excelentes. Poucas vezes o ‘e se’ foi tão bem trabalhado como aqui nos cinemas. A Celine Song, entretanto, vai além do romance para falar sobre solidão, imigração e os laços queridos que a vida, por algum motivo, nos faz soltar. Tudo isso conduzido por um trio de atores escolhidos à perfeição. 

Mais divisivo filme da temporada, “Barbie”, na minha visão, é um baita filme. A Greta Gerwig não apenas conduz a construção de um universo visualmente fantástico como provoca o público a pensar sobre questões delicadas do mundo atual ligadas a gênero em uma obra que poderia ser apenas para vender mais boneca. A escalação de Margot Robbie que era perfeita ganhou ainda um companheiro como Ryan Gosling em altíssimo nível. 

“Oppenheimer” é outro grande filme da temporada. Se o Christopher Nolan não chega a ser um ás do cinema político, por outro lado, a reconhecida capacidade dele em ser maestro de uma condução técnica perfeita aliada a roteiros bem mais densos do que a maioria esmagadora de Hollywood proporciona diariamente eleva a produção a um patamar absurdo. Tendo ao lado dele um elenco de grandes atores em alto nível, o resultado é um filmaço. 

Batendo na casa da obra-prima está “Anatomia de uma Queda”. Pense em um filme bem dirigido! A Justine Triet está mais interessada em debater sobre a construção pública da verdade do que necessariamente em descobrir ‘quem matou’. É a elevação do drama de tribunal a outro campo, muito mais subjetivo e social. Isso tudo com direito a uma atuação fantástica da Sandra Huller. 

O maior filme da temporada, claro, não podia ser outro: “Assassinos da Lua das Flores” está na maior prateleira da carreira de Martin Scorsese, facilmente ao lado de “Taxi Driver”, “Touro Indomável” e “Os Bons Companheiros”. Um olhar crítico sobre a formação dos EUA, ao genocídio cometido pelos povos originários e uma mea-culpa de como o cinema e o showbusiness do país tratou o assunto ao longo do tempo. Atuações formidáveis de Leonardo DiCaprio e Robert De Niro e Lily Gladstone em estado de graça. 

TEMPORADAS PASSADAS

Hora de comparar as edições anteriores com o Oscar 2024. Levando em consideração somente de 2000 para cá, considero a atual temporada uma das melhores disparadas. Raros são os anos em que podemos dizer estar diante de uma obra-prima e outros filmes tão grandiosos.  

Os Oscars de 2002 e 2006 foram as melhores edições da primeira década do século XXI. No ano do penta em uma época de apenas cinco indicados possíveis, a lista trazia os incríveis “O Senhor dos Anéis – A Sociedade do Anel”, fantasia que abria a trilogia mais bem-sucedida dos últimos anos, e “Moulin Rouge”, responsável por modernizar os musicais. Por outro lado, considero apenas bons “Entre Quatro Paredes” e “Uma Mente Brilhante”. 

Quatro anos depois, apesar de não termos nenhuma obra-prima, foi uma temporada de grandes filmes como “O Segredo de Brokeback Mountain”, “Boa Noite, Boa Sorte” e “Munique”. Já “Crash” e “Capote” passavam de ano raspando. 

Nesta comparação com as edições de 2002 e 2006, vejo o Oscar 2024 acima das duas. 

Já na década seguinte, os melhores anos vieram em 2011 com as quase obras-primas “A Rede Social” e “Toy Story 3”, além dos grandes “A Origem” e “Cisne Negro”, e 2014 com “Ela” liderando o time seguido de perto por “O Lobo de Wall Street” e “12 Anos de Escravidão”. 

Mesmo com estes timaços, continuo com o Oscar 2024 na frente. Isso porque em 2011 tivemos muitos filmes apenas bons – Clube de Compras Dallas, “Philomena” e “Capitão Phillips”, enquanto “Trapaça” derrubava um pouco a lista de três anos depois. 

Nos últimos anos, o Oscar 2020 está muito à frente. Quem mandou ser a temporada de Parasita”, “Era uma vez em Hollywood e “O Irlandês”? “Coringa” também era outro grande filme e ainda tinha ali 1917” e “Adoráveis Mulheres. 

Com esta concorrência, eu preciso ceder: a temporada atual não supera há de quatro anos. Foi incrível ver obras gigantescas do Scorsese, Quentin Tarantino e do Bong Joon-Ho juntas. Para mim, é uma das maiores seleções da história de Melhor Filme, nível de 1940 e 1977, anos, respectivamente, de “E o Vento Levou” e “Um Estranho no Ninho”. 

De qualquer modo, a temporada atual entra para história sim como uma das grandes. Deve ficar no TOP 15, TOP 20 de melhores da história.