O Oscar 2022 tem uma missão muito clara: recuperar o interesse do grande público na premiação. Isso se faz necessário, principalmente, após o fracasso da cerimônia do ano passado quando a audiência foi a pior da história com média de apenas 9,85 milhões de espectadores nos EUA. 

Se o evento, pelo menos, voltar ao patamar de 23 milhões registrado em 2020 na vitória de “Parasita”, já será motivo de celebração. Porém, o temor de não atingir o objetivo é generalizado e a Academia passa recibo a cada medida anunciada.  

Regina Hall, Amy Schumer e Wanda Sykes comandarão o Oscar 2022 – elas terão uma hora cada da festa.

Dois anúncios feitos na semana dão uma boa dimensão do cenário preocupante: o primeiro veio com o anúncio do trio de apresentadoras da festa – Regina Hall, Amy Schumer e Wanda Sykes. Com todo o respeito, nenhuma delas tem peso suficiente para serem atrativos da festa, ou seja, ninguém vai assistir o Oscar por conta delas.

Diferente do que ocorreria como nomes como Tom Holland, Dwayne Johnson e o trio de “Only Murders in the Building”, Steve Martin, Martin Short e Selena Gomez. A escolha em cima da hora pela Academia acaba por limitar as opções da festa. 

Público do Twitter irá escolher o filme e a cena favorita do ano.

O segundo é ainda pior: a decisão do público, via Twitter, escolher o filme e a cena favorita do ano.

Traduzindo: é um remake da ideia do Oscar Popular, mas, com o risco de sofrer uma trolagem gigantesca por parte do público.

A busca por engajamento nas redes pode ser um tiro no pé em vez de uma isca para a audiência, afinal, as chances de acontecer uma zoeira são maiores do que as pessoas levarem à sério a votação até pela dinâmica das redes sociais.

E pior: nada garante que elas irão assistir à festa. 

Grande parte destas tentativas da Academia acaba sendo um reflexo para tentar compensar uma lista que, novamente, deixa de fora os principais sucessos de bilheteria do ano.

Esnobada de “Homem-Aranha: Sem Volta para Casa” provocou críticas de uma parcela do público.

A maior revolta ficou por conta da ausência de “Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa”: nem mesmo a bilheteria superior a US$ 1,8 bilhão de dólares em plena pandemia foi suficiente para a Academia se comover, preterindo o longa para dar espaço ao japonês “Drive My Car” e fracassos de bilheterias como “Amor, Sublime Amor”. 

Com isso, ressuscitou a conversa sobre o Oscar estar cada vez mais elitista e distante do público. Mas, será que é isso mesmo? 

ELITISTA OU NÃO: EIS A QUESTÃO? 

“Pantera Negra” foi a maior bilheteria de um indicado ao Oscar de Melhor Filme nos últimos anos.

Para esta discussão, vamos iniciar pegando a lista de indicados. Exceto pelo Oscar 2021, realmente atípico por conta dos efeitos da pandemia, os últimos anos sempre trazem grandes sucessos de bilheteria entre os indicados a Melhor Filme. 

Do Oscar 2015 para cá, foram nomeadas cinco produções no TOP 10 de sucesso comercial no EUA: “Sniper Americano” com US$ 348 milhões, “Perdido em Marte” com US$ 225 milhões, “Pantera Negra”, maior arrecadação de 2019 com US$ 700 milhões, “Coringa” com US$ 333 milhões, e “1917” com US$ 157 milhões.  

Ainda há filmes que ultrapassaram 200 milhões como “Nasce uma Estrela” ou que se aproximaram da marca como “O Regresso”, “Dunkirk” e “Bohemian Rhapsody”. 

Crítica: Argo, de Ben Affleck

“Argo” foi o último ganhador do Oscar a faturar mais de US$ 100 milhões nas bilheterias dos EUA.

Por outro lado, “Argo”, em 2013, foi o último filme a vencer o Oscar a ter ultrapassado a marca de US$ 100 milhões, algo diferente do que ocorrera na década anterior quando “Gladiador”, “Uma Mente Brilhante”, “Chicago”, “O Retorno do Rei”, “Menina de Ouro”, “Os Infiltrados” e “Quem Quer Ser um Milionário” atingiram este feito. 

Para 2022, a Academia apresenta uma lista não tão popular como gostaria, mas, também longe de ser inacessível ao grande público. 

“Duna” é disparada a maior bilheteria entre os indicados a Melhor Filme do Oscar 2022.

“Duna” é disparado o filme de maior bilheteria entre os 10 nomeados ao ter arrecadado US$ 107 milhões nos EUA e US$ 292 milhões ao redor do planeta. Isso em plena pandemia e com janela de lançamento não muito distante da HBO Max.  

“Não Olhe Para Cima” quebrou recordes de visualizações na Netflix e foi a produção mais comentada no fim de 2021, enquanto “Ataque dos Cães” retornou ao TOP 10 dos mais vistos do streaming nos EUA após as nomeações.  

Fracassos mesmo foram “Amor, Sublime Amor” com faturamento de US$ 37 milhões, resultado sofrível para um filme de Steven Spielberg, “King Richard” com quase US$ 15 milhões, e “O Beco do Pesadelo” que arrecadou US$ 11 milhões. 

“007: Sem Tempo para Morrer” indicado a Melhor Filme? Seria injustiça com “Cassino Royale” e “Skyfall”…

Agora, se analisarmos o TOP 10 das bilheterias americanas, fica a grande questão: quem poderia entrar sem parecer algo forçado? 

Indicar a Melhor Filme “Free Guy”, “Ghostbusters”, “Um Lugar Silencioso 2”, “Eternos”, “Velozes e Furiosos 9”, “Viúva Negra”, “Venom 2” e “Shang-Chi”, com todo o respeito, seria a desmoralização do Oscar de uma vez por todas.  

Sobram “007 – Sem Tempo Para Morrer”, despedida de Daniel Craig como James Bond, mas, que dividiu bastante os fãs e a crítica, e “Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa”, aventura divertida da Marvel que entrega todos os fan-services possíveis e imagináveis, mas, com uma direção péssima do Jon Watts e que depende demais do entusiasmo do público para funcionar sem a gente observar os problemas da história. 

Mesmo detestando “King Richard”, por exemplo, não vejo nem “007” ou “Homem-Aranha” à frente de alguns dos grandes filmes esnobados no Oscar 2022 citados no meu último vídeo. Situação semelhante posso estender a anos anteriores. 

Questionado “Blade Runner 2049” merecia muito mais a vaga do que o sucesso “Mulher-Maravilha”

 Em 2020, mais absurdo do que “Vingadores: Ultimato” ficar fora de Melhor Filme foi não ter visto “Nós”, “Dois Papas”, “Dor e Glória” ou “O Farol”.

No ano anterior, a esnobada maior foi a “Blade Runner 2049” em vez de “Mulher-Maravilha”.

Em 2015, o TOP 10 foi liderado por “Guardiões da Galáxia”, “Jogos Vorazes” e “Soldado Invernal”, enquanto a Academia deixou de fora “O Abutre”. 

Por outro lado, não dá para negar também a miopia e até mesmo falta de coragem da Academia em se permitir abraçar produções capazes de fazer esta ponte entre público e o Oscar. 

“Logan” deveria ter sido indicado em 2019.

Foi o que ocorreu ao optar pelo bom, mas, trivial “Spotlight” quando poderia ter consagrado “Mad Max” ou “O Regresso” e em 2018, com “A Forma da Água” superando o excelente “Corra”.

Em 2017, “Deadpool” poderia ter sido o décimo filme indicado sem grande prejuízo à lista de nomeados com o mesmo valendo para “Logan” dois anos depois. 

Diante deste cenário, acho radical demais dizer que o Oscar, ainda que com seus erros e acertos, tenha se virado contra o público e se fechado à indústria e crítica. Mesmo que ocorra resistências enormes aos filmes baseados em histórias em quadrinhos dentro da Academia, também vejo que há reconhecimento a eles quando saem do comum, como foram os casos de “Pantera Negra” e “Coringa”, justamente dois dos melhores filmes do gênero.  

Oscar 2021 teve a audiência mais baixa da história da premiação – média de 9,85 milhões espectadores nos EUA.

Acima de tudo, sinto sim que há uma diferença entre o que deseja a Academia como instituição – produções mais populares para atrair o público visando uma audiência maior para si e seus parceiros comerciais – e seu corpo votante – focado mais na questão conceitual de diversificação de gênero, raças e até mesmo global da festa advinda da renovação em massa provocada após o #MeToo, #OscarSoWhite e a entrada de membros dos mais diversos cantos do planeta. 

Nesta balança, acredito que o entendimento maior da Academia seja compreender que as audiências de 40, 50 milhões de espectadores não se repetirão mais, exceto em casos excepcionais como foi na cerimônia do fenômeno “Titanic”. Por outro lado, o índice de 2021 também deverá ser uma exceção – até o Super Bowl do ano passado registrou baixos números em comparação aos anos anteriores.  

Acredito que a tendência seja estabilizar na casa de 20 a 25 milhões, bom índice para tempos em que os interesses são tão múltiplos e difusos – lembremos as tão tradicionais novelas no Brasil, hoje em dia, por pior ou melhor que sejam, dificilmente ultrapassam 30, 35 pontos. 

Caso queira maiores índices, caberá a Academia repensar estratégias em vez de entregar o mesmo de sempre.

Por que não pensar no online como uma opção de transmissão ou uma segunda tela para além das redes sociais?

Ou negociar com estúdios lançamentos de trailers nos intervalos nos moldes do Super Bowl?

O retorno das homenagens a grandes nomes do cinema – talvez em uma consulta pública no site da Academia?

Uma cerimônia mais dinâmica com apresentadores realmente populares? 

Caminhos não faltam para a Academia repensar o Oscar como atração para o público. 

Conseguirá o Oscar 2022 reverter a tendência de queda da audiência?

Criar ou mexer nas categorias de premiação e querer jogar a responsabilidade na esnobada de um ou outro filme é apenas jogar a poeira para debaixo do tapete.